Sexta-feira, 29 Março

O método Isabelle Huppert

Entre as 21 longas-metragens na disputa pela Palma de Ouro de 2019, na exemplar seleção do 72º Festival de Cannes, está uma produção independente americana rodada em Portugal, na cidade de Sintra, o drama de tons cómicos Frankie, que traz como seu chamariz a estrela nº 1 dos ecrãs franceses: Isabelle Huppert. É um dos filmes mais controversos do evento, cercado de uma áurea de “ame-o ou deixe-o” pela sua estrutura narrativa de muito falatório, que faz lembrar uma mistura de All about Eve com a estética de Robert Altman. Sob a direção de Ira Sachs (num registo de uma firmeza impecável), Isabelle vive a atriz Frankie, um modelo de talento que é matriarca de uma família multinacional. Seu clã se encontra em solo português A fotografia é do genial artesão da luz Rui Poças.

O que faz uma atriz é a curiosidade. Há muita coisa que aprendemos nesse ofício de atuar quando se tem disciplina. Mas nada é útil se não existe curiosidade por boas histórias, pois elas são pedacinhos de um quebra-cabeça sobre a condição humana“, disse Isabelle ao C7nema na Berlinale de 2018, quando concorreu com Eva, de Benoît Jacquot.

Qualquer festival de cinema internacional que se preze, como o de Berlim e o de Cannes, deve ter La Huppert nos seus ecrãs, como é o caso agora de Tribeca, em Nova York, que se divertiu, no fim de semana, com a projeção da comédia de tons cítricos Blanche comme neige, de Anne Fontaine, na sua competição de longas-metragens estrangeiras. Onde a diva francesa passa, ela chega causando e abrindo debates. Traduzido nos EUA como White as snow, numa referência direta à fábula da Branca de Neve, o novo filme de Anne, atriz e realizadora de sucessos como Coco avant Chanel (2009), põe Isabelle como a madrasta má da jovem Claire (Lou de Laâge).

A maldade é um espaço de transgressão“, disse Isabelle ao C7.

Só que nesta revisão crítica – e feminista – de Anne, todas as ruindades que a Branca de Neve, no caso Claire, deveria sofrer ficam para segundo plano. O que conta aqui é a emancipação da jovem, a sua descoberta do desejo e a arte de mexer com a libido de homens e mulheres. Lançado há duas semanas na França, a fita vem sendo aplaudida pelo seu revisionismo das discussões de género

Estamos a viver um momento feliz de diversidade“, disse Isabelle em Cannes, em 2018, quando o trabalho com Frankie começou. “Estou na estrada há tempos e já trabalhei com muitos olhares estéticos distintos sobre a vida. Em cada trabalho, tento tirar um pouco de cada um para crescer como artista, como faço ao filmar com a Anne. Não vejo nenhum cineasta, homem ou mulher, mesmo os mais renomados, como professores com quem você tem lições: realizadores são parceiros de construção, de quem você pega emprestado olhares sobre o mundo. São os meus colegas de estrada. Pavimentamos obras juntos. Cada papel, leva-nos a territórios diferentes do que somos“.

Depois de estrear em Portugal, no Brasil, Isabelle volta ao circuito com o lançamento de Obsessão, título nacionalbr do filme de suspense Greta, de Neil Jordan, que teve sua estreia mundial em Toronto, em setembro. “Atuar em inglês é algo que já faço deste o fim dos anos 1970. Já tinha a feito coisas de muita qualidade em Hollywood, como Heaven’s Gate, do talentoso Michael Cimino, que sofreu muito pelo fracasso daquele belo filme. Fiz umas coisas bem estranhas também por lá, como Huckabees – A Vida é uma Comédia, com Dustin Hoffman, lembra Isabelle. “Cada experiência, seja onde for, é uma aprendizagem“.

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