Sexta-feira, 29 Março

Étienne Comar fala ao C7nema sobre o polémico «Gauguin – Voyage de Tahiti»

O filme Gauguin – Voyage de Tahiti, estreado em França no passado 20 de setembro e exibido esta semana na Festa do Cinema Francês (Lisboa, Almada e Cascais), está a provocar alguma polémica em França, tendo surgido na imprensa acusações que os atos «pedófilos» do célebre pintor são silenciados no filme de Edouard Deluc.

A controvérsia, que sempre acompanhou a revisão do trabalho do autor, foi lançada pela publicação Jeune Afrique, a qual – após o lançamento do filme dedicado à vida na Polinésia do pintor – reprova o seu silêncio sobre a grande diferença de idades entre o artista, de 43 anos e a vahine (cidadã do Taiti) Teha’amana (Tehura) de 13 anos, com a qual se relacionou. Mais. O artigo, assinado por Léo Pajon, critica ainda o facto da obra poder sugerir que essa jovem não era a única a partilhar a vida do artista na ilha: «também havia a jovem prostituta Titi, bem como Pau’ura e Vaeoho (ambas de 14 anos). Finalmente, o último ‘esquecimento’ do filme é que ele sofreu com a sífilis, uma doença sexual potencialmente fatal, que ele distribuiu generosamente pelo Taiti. No filme, Gauguin só é diagnosticado com diabetes  (…) até no riamos se o caso não fosse grave».

O caso ganhou uma nova dimensão quando Léa Salamé, do programa televisivo Stupéfiant! (da France 2), questionou Vincent Cassel sobre o caso: «A Tehura tinha 13 anos. Havia toda uma má reputação na última parte da sua vida que vocês não mostram no filme », pergunta Salamé ao convidado após a transmissão de uma peça que mostrava a relação complicada entre os taitianos e o legado de Gauguin. A isto Vincent Cassel respondeu: «13 anos na época, não são 13 anos  agora… Sim, eram tempos arcaicos, era completamente louco, mas era assim». Cassel admite também que no final da sua vida, Gauguin «tornou-se um homem terrível», percebendo completamente porque não deixou boas lembranças no local.


Vincent Cassel

Questionado pelo c7nema, Étienne Comar (Django), um dos argumentistas do filme, deu a sua opinião: «O argumento que escrevi tinha muito mais coisas nefastas sobre o Gauguin. Tinha a parte em que ele esteve com a doença venérea (…) a escolha (de Edouard Deluc) não foi mentir. Ele não mentiu. Ele decidiu foi basear-se no diário da viagem do Gauguin, o Noa Noa. Quando lemos esse caderno da viagem, que foi o próprio Gauguin que escreveu, vemos que está escrito de uma forma muito sentimental. Porque ele viu a história como sentimental (…) quando olhamos para a realidade do guião anterior, é verdade que era mais duro, e eu tomo o partido de mostrar uma história mais dura. Mas ele preferiu essa ideia [mais romantizada] (…) Vamos lá ver, naquela época – mesmo que seja uma coisa louca de se dizer nos dias de hoje – o conceito de jovem era muito diferente. No Taiti, as mulheres casavam-se aos 13 anos, 14 anos. Não é como se ele tivesse raptado uma jovem, violado. Bem, há sempre um julgamento nas palavras. No argumento que escrevi tudo era muito mais ambiguo, porque eu adoro a ambiguidade. O Edouard preferiu outra linha, algo mais atraente, e a verdade é que se pegarmos no Noa Noa vemos que é muito romântico como história. Ele (Gauguin) escreveu assim porque desejava uma história romântica, ele queria isso, até porque a vida com a sua esposa já não existia. Ele sonhava em se tornar romântico (…) Claro que o jornalistas lançaram a controvérsia, ‘ele mentiu’, etc… O Edouard não mentiu. Ele fez uma ficção, não foi um documentário.»

Colmar disse ainda que hoje em dia existe uma censura da imprensa de como um filme deve ser, até porque o Cinema sempre jogou com a ficção ao retratar a realidade, mas que não existe essa questão na Literatura, onde tudo é permitido. 

Curiosamente, hoje (11/10) abriu em Paris uma exposição denominada Gauguin l’alchimiste, a qual mostra todos os trabalhos do pintor. Até ao momento não há nenhuma polémica ou protesto associado a esta exposição.

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