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Cannes – Um festival de ativismo e poesia pelo meio

Em 2017, a Quinzena é quem mais ordena. A mostra fundada por Phillipe Garrel e outros apresenta este ano um leque forte de nomes que de certo rivalizaram com a grande Competição no Palais. Dumont, o português Pinho, Ferrara e até o próprio Garrel fazem as delícias dos cinéfilos mais aventurosos e mais incentivados a nichos.

Garrel foi uma das grandes apostas para esta edição. Difícil não o ser, visto que o francófono mantém uma atividade plena e invejável com os seus 69 anos. Porém, falta-lhe revitalidade, o cineasta procura-o há anos, ou simplesmente, como transparece, nem sequer entusiasma em encontrar novas formas de instalar o seu cinema. Garrel continua ofuscado pelo seu cinema de outrora e pelos fantasmas que o perseguem e teima em não evadir. Em L’amante d’un Jour, eis mais um enredo de relações perturbadas pela sombra do adultério e filosofias conjugais que nos fazem questionar se o realizador ou não, vive num casulo este tempo todo. Aliás a sessão de apresentação do seu filme contou a sua presença, assim como a do elenco, mas Garrel preferiu isolar-se, seguindo para o fundo da plateia, mesmo encostado a porta de saída. Talvez seja apenas timidez ou receio dos aplausos cínicos que estas sessões de público parecem manifestar no final. Entre obrigados e elogios, a verdade é que foram muitos, durante o filme, que cediam à força da luz verde com palavras EXIT.

Melhor recepção obteve Ôtez-moi d’un doute, de Carine Tardieu, a habitual comédia francesa de mal-entendidos sobre a paternidade que se fica pela competência esquecível. A plateia divertiu-se.

No Un Certain Regard chega-nos directamente da Tunísia a realizadora Kaouther Ben Hania e o seu Beauty and the Dogs, um conto contado em 9 partes, todas elas compostas por um único plano-sequência, que remete uma noite atribulada de uma jovem violada, que tenta, num sociedade dominante machista, lutar pelos seus direitos. Estranho que pareça, ela luta pelo seu direito de vítima. Apesar dos ocasionais momentos de discursos preguiçosos dignos de panfleto, Beauty and the Dogs é um alerta para um realidade que constantemente fechamos os olhos ou negamos a sua existência.

Mas foi com outra luta que Cannes foi ao rubro, 120 Battement per Minut, de Robin Campillo (Eastern Boys), o activismo dos seropositivos e da comunidade LGBT pela integridade numa sociedade preconceituosa, discriminatória, e talvez pior que isso, negligente. Não é o mero filme de mensagens debitadas nem de propagandas oportunistas, a obra é um verdadeiro embate do slogan “eu quero viver”, o prolongamento da vida cuja morte parece um destino vizinho. Os 5 minutos de Paraíso com direito a orgias visuais, onde moléculas e humanos bailam aos som das vitórias e das derrotas das suas respectivas vidas. Sim, é um poema. Um poema cinematográfico. O Grand Theatre Lumiere soube no final receber, de forma merecidas, estes 120 batimentos por minuto. Será que temos Palma de Ouro?