Sábado, 27 Abril

«Boyhood» (Boyhood – Momentos de uma Vida) por Hugo Gomes

Boyhood tem conquistado a atenção global pelo seu “how i made it“, ou seja o badalado procedimento das filmagens. Aliás, não é todo os dias que nos surge um filme que fora rodado em 12 anos, muito mais um drama no qual é possível testemunhar o crescimento natural da sua principal personagem, Mason (Ellar Coltrane, em gradual fase de evolução como ator), ao invés de nos depararmos com um artificialismo cinematográfico.

Richard Linklater, o mesmo homem por trás da trilogia Antes do Amanhecer, entrega-se a um drama tipicamente virtuoso da tendência “coming-of-age“, que evidencia os diversos factores de crescimento de um ser. Neste caso, assistimos primeiramente a uma criança de 6 anos a chegar à tenra idade dos 18 e os passos cruciais na construção da sua personagem.

É uma narrativa esquemática que é beneficiada pelo seu modus operandis, uma biografia fictícia que termina por ser identificável pela maioria do seu público, visto ser fácil encontrar algum facto ou elemento que nos remeta à nossa infância ou juventude. Talvez seja por isso que a aclamação mundial se torna evidente, mas é verdade que Boyhood tem as suas próprias virtudes, longe do “12 anos de produção” que serviu como marketing.

Eis um filme que nos faz olhar não para o seu personagem mas para o seu exterior, o biótopo que o rodeia. Pois bem, Linklater minou a sua epopeia dramática com todo o kitsch possível de cada época retratada. É cultura pop encruzilhada com as temáticas sociais correspondentes a cada atualidade e a influência que esses ditos factores possuem no derradeiro crescimento de Mason, cuja chegada aos 18 anos encerra um filme, mas inicia outro, apenas disponível na nossa memória e premonição.

Se Mason é realmente uma figura que interliga o público com a trama exposta no ecrã, Patricia Arquette como a mulher fracassada, mas mãe esforçada, serve de alicerces para o desempenho de Coltrane e de Lorelei Linklater (a filha do realizador que interpreta a irmã de Mason). Por sua vez, o pai ausente, o “duque do indie norte-americano” Ethan Hawke, é visto e salientado pela câmara de Linklater como um herói “sebastianino”, cujas escassas presenças trarão conforto e estima à vida de Mason, ao mesmo tempo que culmina metáforas de foro vivente. Ambos os atores que preenchem o papel de progenitores, também eles vitimas do envelhecimento transposto pelo realizador, polvilham o universo deste “boy” em algo verdadeiramente dinâmico e, ao contrário da sua narrativa, longe da farta esquematização.

Mais do que criar coincidências com as quais nos identificamos de forma nostálgica, Boyhood é o espelho da sociedade norte-americana ao longo de 12 anos, para que não resumíssemos o filme em somente “12 years in making“. Quando a vida torna-se no verdadeiro espectáculo cinematográfico.

O melhor – Para além da sua badalada rodagem, a conexão do desenvolvimento de uma criança com o meio em que vive.
O pior – ser resumido aos ditos 12 anos, constastes falhas de raccord imperdoáveis nos primeiros minutos da película.


Hugo Gomes

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