Sexta-feira, 26 Abril

As maiores “banhadas” de 2016

 

ba·nha·da
(banho + -ada)
substantivo feminino
1. [Portugal, Informal] Desilusão ou engano (ex.: tinha altas expectativas e levei uma banhada).

“banhada”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa

 

À Procura de Dory

A maior e mais lamentável desilusão do ano foi a sequela a uma das jóias da coroa da Pixar. Dory nunca tinha sido mais que um sidekick cómico, capaz de quebrar a seriedade paternalista em que À Procura de Nemo poderia cair. O resultado é desastroso: ao tentarem tornar em mártir (é o termo correto) o mais célebre cirurgião-patela do cinema, permanentemente com argumentos dignos de choradinhos de telenovelas (“tenho perda de memória!” Não encontro os meus pais!”Sou uma desgraçada!”), é impossível não sentir a manipulação sentimentalmente ofensiva a que está a ser levada a audiência. E, tal como a protagonista, somos levados a crer que temos memória curta, ouvindo, a cada 5 minutos, esses queixumes. Muito mais comovente era o desfecho do original do que toda a hora e meia deste lastimável filme. Justamente porque não parecia forçado nem implorava, de joelhos, pela nossa compaixão.

Menção desonrosa: Love  pela crença presunçosa de que sexo explícito não-simulado é o suficiente para compensar diálogos risíveis, planos absurdos (ah, aqueles grandes planos ejaculatórios) e um ritmo lento que julga que é para tudo isto ser levado a sério.

Duarte Mata

Animais Noturnos

O meu barrete do ano é de marca e tudo, mas que isso não sirva para enganar o vazio e o aglomerar de decisões erradas por detrás de tanto estilo. Tom Ford, que tinha surpreendido três quartos do mundo com o ainda brilhante “A Single Man“, espalha-se ao comprido na sua segunda longa-metragem. Inicialmente prometedor, o filme começa a descarrilar ainda mais que o comboio de Emily Blunt aos Oscars assim que a personagem de Amy Adams começa a ler o romance “tão bom” do seu marido, mas que no fundo é mesmo tão mau ou pior que o filme envolvente. Seria até um objeto interessante não fosse o realizador levar cada minuto da sua subtrama tão a sério.

Menção desonrosa para o novo filme de Cristian Mungiu (“4 Semanas, 3 Meses e 2 Dias“): “O Exame“. Um filme que, à imagem da escolha principal, promete muito pela sinopse, pelo trailer e pelo passado do realizador, para depois nos dar uma quase nulidade de motivos para investirmos nele, a partir do momento em que captamos as suas intenções de não se resolver. E não falamos de escapar a resoluções fáceis, à boa maneira Verhoeviana, ou mesmo à maneira de Mungiu via “4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias” – falamos de não apresentar qualquer resposta ponto. E pavonear-se nessa mesma ausência. 

André Gonçalves

O Herói de Hacksaw Ridge

O “cristianismo” de Mel Gibson é o da pior espécie – vem daquele messianismo-proselitista-militarista que levou os europeus pelos séculos afora a matar os infiéis à catanada em nome de Deus. “O Herói de Hacksaw Ridge” é um filme perverso, onde o martirológio do protagonista, tão ao gosto do homem da “Paixão de Cristo”, transforma-se apenas num ato de suprema hipocrisia. E porquê? Porque o ator/realizador escolheu para contar uma história de guerra e aqui não há lugar para dar a outra face – antes apenas continuar a carnificina contra um inimigo sem dignidade e sem rosto (afinal os japoneses são todos iguais, certo?) em nome do Deus América. Gibson, sob uma suposta capa cristã, não decidiu contar uma história bélica para propor algo pacífico – mas antes para confirmar o desejo de violência de uma certa sociedade atual. Para esta gente, a boa nova é que o Redentor já chegou – atende por Donald Trump.

Menção desonrosa: American Honey. Este é um filme de excessos – entre os quais o principal é mostrar que aquilo que já foi hipster (a destruição de TODOS os paradigmas morais pela pós-modernidade) começou a azedar – e a exalar intenso mau cheiro. Já é hora de alguém propor outra coisa – algo de útil, só para variar.

Roni Nunes

Rogue One: Uma História Star Wars

Não?! Eu por banhada defino algo que me desilude profundamente, porque não era evidente que seria banhada. No caso de Rogue One, a escolha nem foi difícil, já que era grande a expetativa, corroborada até pelas primeiras acaloradas opiniões. Mas quando um filme sem alma e sem chama faz valer a sua bandeira, acenamos, cantamos com um sorriso: ba-nha-da!!

Menção desonrosa: Deveria ser O Amor é Lindo… Porque Sim ou Mestres da Ilusão II. Mas a minha menção honrosa vai mesmo para À Procura de Dory, por a Pixar fazer como a Disney e recuperar um novo público usando o disfarce de um clássico.

Paulo Portugal

Capitão América: Guerra Civil

O leitor estará neste momento a questionar, porquê que num ano com tantos super-heróis, selecionei Capitão América: Guerra Civil como a maior banhada do ano? Simples, para além da homogeneidade do projecto, a Marvel novamente sem personalidade nos seus eventuais capítulos, temos um filme incoerente disfarçado através de uma narrativa linear (ao contrário da “barafunda” cronológica de Batman V Superman que foi o seu grande pecado). Nessa incoerência encontramos uma aspiração de episódio político que de político nada tem, desde um Capitão América que desafia a ONU para prevalecer as suas ideologias de invasão autodidata, até a um Homem de Ferro preocupado com danos colaterais e de assumir responsabilidades que mesmo assim recruta um jovem de 15 anos para combater na sua causa, chegando por fim a um plot device tão idiota como a “Martha” do filme de Snyder. Depois desta “guerrinha“, tornam-se todos amigos, sem baixas, até porque as personagens são demasiado importantes para a Disney em futuros rendimentos. Fascismo industrialista contado para “criancinhas“.

Menção desonrosa: Mel Gibson regressa na sua pior forma em O Herói de Hacksaw Ridge, a demonstrar que, passados setenta anos, os japoneses continuam a ser retratados como os asquerosos inimigos dos EUA. Valha-nos Clint Eastwood!

Hugo Gomes 

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