Quinta-feira, 28 Março

«7 Kinds of Wrath» por André Gonçalves

O cinema grego tem dado cartas desde que Giorgos Lanthimos lançou Canino ao mundo, e mesmo não passando necessariamente no circuito “queer”, os últimos filmes que nos têm sido revelados do berço da democracia poderiam perfeitamente encaixar nesse rótulo que recusa rótulos.

7 Kinds of Wrath é o mais recente exemplo feliz de um cinema com um olhar sempre fora da caixa, onde o absurdo de algumas vinhetas, potencialmente todas metafóricas, convive muito bem com a narrativa base, embora seja um poço de referências tão grande que tudo nos parece difícil de absorver de uma assentada.

Ao descrever a relação difícil de amor/desejo entre um arquélogo grego quarentão e um imigrante egípcio de 20 anos, o realizador Christos Voupouras tem aqui um saco cheio de referências culturais/religiosas e económicas (tanto pela eterna crise, como pelo custo do que é imaterial) ao seu dispor. Com tanta areia no camião, é um trabalho herculeano montar tudo de forma a apresentar um pacote convidativo. Mas Voupouras consegue, de uma maneira bem grega, tecer um fio linear, onde o que não faz sentido à primeira não nos tira necessariamente do filme, antes nos intriga a querer saber mais.

Voupouras foge até à norma de ser um realizador na sua primeira ou segunda longa-metragem a apresentar um filme em competição. Este é um cineasta já veterano, com 30 anos de carreira, e felizmente essa maturidade reflete-se nesta obra, desde a direção de atores – com destaque óbvio para o duo Haris Fragoulis e Nikos Gelia (Xenia), até à maneira como, em conjunto com o diretor de fotografia Kostas Gikas, encenam planos num preto e branco muitíssimo bem trabalhado e que acaba por ter aqui um papel mais importante do que se pensava à partida.

Um filme difícil de se amar à primeira, mas cujo fascínio já presente no primeiro visionamento convida facilmente a futuros revisionamentos…

 

 

André Gonçalves @QueerLisboa19

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