Quinta-feira, 25 Abril

«Ela Volta na Quinta» por Roni Nunes

As propostas de aprofundamento do realismo no cinema não têm deixado de se renovar ao longo dos últimas décadas – como o demonstra o exemplo recente de um dos mestres do cinema indie norte-americano – um dos redutos favoritos destas experiências. Fala-se de Boyhood, onde Richard Linklater levava muito mais adiante as suas propostas anteriores assim como de outros dos seus contemporâneos.

Mas, com exceção de um objetivo com certas interseções, as obras yankees nada têm a ver com este primeiro trabalho do cineasta brasileiro André Novais Oliveira – que prima menos pela criação ficcional e chega muito mais próximo da fronteira documental. Ele aqui traz a sua família verdadeira (para além dele próprio) para protagonizar esse registo sobre vida quotidiana, traições e transitoriedade. No centro está o casal de meia-idade, junto há 38 anos mas em crise pelas suspeitas por parte da esposa de que o seu marido tem uma amante, e os dois filhos. Como secundárias aparecem as esposas dos irmãos.

André filma as ruas de um centro urbano de Minas Gerais (região do Sudeste brasileiro) – dando importância aos cartazes que enxameiam muros, postes, paredes e que anunciam de tudo, de concertos de música popular a arranjos de eletrodomésticos. Percorrem o filme as suas estradas descuidadas, prédios, vivendas e multidões de anónimos em trânsito. Já as personagens são encontradas em casa a ver vídeos do youtube, a ter conversas sobre cansaço, de desejos e de problemas.

O realizador joga à sua maneira com elementos como tempo, enquadramentos, diálogos e encenação: os planos por vezes esticam-se na duração, os protagonistas aparecem em ângulos não usuais ou fora de campo durante vários minutos, entre outros artíficios que serve para situar o espectador na realidade bem palpável daquelas pessoas “normais”.

A proposta tem o seu mérito, embora acabe por quase chegar a um beco sem saída em termos cinematográficos – como a longa cena final que, se funciona bem como artifício narrativo e conceitual (determinando que, “apesar de tudo”, a vida continua), por outro o seu maior alcance está em funcionar como espécie de “amostragem sociológica”. O recurso dos diálogos, por sua vez, nem sempre se aguenta – surgindo em algumas situações despido da espontaneidade exigida.

O melhor: a proposta é, em si, interessante
O pior: momentos onde a pretendida espontaneidade não funcionam 


Roni Nunes

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