Sexta-feira, 26 Abril

«Listen Up Philip» por João Miranda

Há um cliché sobre o escritor nova-iorquino anti-social e sempre irado que já foi muito explorado no cinema, especificamente por Woody Allen. Este cliché poderá ou não ter tido base na realidade, mas, depois de décadas, parece só fazer sentido para quem habita esse mundo, quer como modelo possível de comportamento, quer como base para humor. Listen Up Philip é um filme anacrónico não só no seu estilo (visual e sonoro), mas também porque se alimenta exclusivamente desse cliché, sem qualquer variação e com muito pouco espaço para respirar fora dele.

O novo projeto de Alex Ross Perry é a história de Philip Lewis Friedman, desempenhado por Jason Schwartzman, um escritor que começa a ganhar alguma projeção e cujos ego e raiva constante assumem proporções insuportáveis com a validação que sente. Nas primeiras cenas vemo-lo a atacar as pessoas que sente que não o suportaram no passado, baseado no sucesso que pensa estar a ter. Algum tempo depois conhece o seu ídolo, acaba por começar a sociabilizar com ele e este consegue encontrar-lhe uma posição académica de escrita criativa.

Percebe-se pela maneira como o filme está construído, quer pela voz off, quer pelos tempos dos diálogos, que este filme será uma comédia, mas, para quem está fora deste mundo, a maior parte das piadas são mais tristes que certeiras. Dentro da cultura norte-americana, especificamente a de Nova Iorque, a fita poderá funcionar muito bem, mas tirado desse contexto é só um filme triste sobre uma pessoa desagradável. As cenas sucedem-se em que Philip é desagradável para quem está à sua volta, sem qualquer motivo aparente e sem qualquer ganho. Sem querer entrar abertamente no reino da comédia, como Woody Allen, as piadas saem como frases com tempos estranhos e as reações não parecem ser as esperadas.

A estrutura  também acaba por não o servir da melhor forma. Dividido entre várias personagens, há seções inteiras sem o titular Philip, em que a história parece desviar-se sem grande propósito. Estranhamente, algumas dessas são também as cenas que melhor resultam no filme. Longe do desagradável Philip, vemos a recuperação de Ashley, a sua namorada, perante a sua ausência que, apesar de todos os problemas que vemos e que nos são contados, não parece conseguir cortar a relação tóxica com ele. Nesses momentos, o filme consegue ser sensível e estes acabam por se tornar, apesar da sua brevidade e estranheza dentro da estrutura, pequenas bolhas de ar onde conseguimos respirar.

Listen Up Philip poderá encontrar algum sucesso na crítica norte-americana, especialmente a da costa leste, mas terá alguma dificuldade em encontrar público fora dela.

O Melhor: Ashley; As capas dos livros.
O Pior: Philip; O anacronismo; A falta de imaginação.


João Miranda

Notícias