Terça-feira, 16 Abril

«Flowers of Taipei: Taiwan New Cinema» por Roni Nunes

Resgate de uma era, no início dos anos 80, onde o cinema de uma pequena ilha, então isolada diplomaticamente em função de um bloqueio imposto pelos Estados Unidos e pela China, deu nas vistas nos festivais europeus e entrelaçou-se com os destinos da elite cultural do seu país em transformação. Taiwan já é, por si, uma curiosa amálgama demográfica, que reúne nativos com expatriados do continente e que, na época das restrições, viu beneficiada uma classe média que ansiava por uma liberdade nos moldes liberais. Hao Hsiao-Hsien e Edward Yang lideraram no cinema um tempo de efervescência cultural daqueles onde a arte se conjuga de forma mais próxima aos destinos do local onde é produzida.

O documentário de Chinlin Hsieh parte da representação geográfica do fenómeno, reunindo especialistas e realizadores de topo para caraterizar a amplitude da influência do cinema de Taiwan. Testemunhos vindos da Argentina, de França, Itália, Holanda, Estados Unidos e, como não poderia deixar de ser, dos demais países asiáticos com um cinema importante (Japão, China, Hong Kong, Tailândia) corroboram o enorme alcance desta vaga.

Flowers of Taipei: Taiwan New Cinema traz um filme milimetricamente pensado, incorporando na sua própria narrativa algumas das características do próprio cinema que retrata – entre os quais os travellings invertidos tão ao gosto de Hsien. Ao mesmo tempo, os depoimentos mesclam-se com trechos das obras – entre os quais o final com uma belíssima sequência de Goodbye, South, Goodbye, do mesmo realizador. A qualidade das entrevistas varia – mas o recurso de pôr dois pensadores por vezes em conflito mexe no esquematismo e cria fagulhas – como Olivier Assayas e o crítico Jean-Michel Frodon e, o melhor momento, a discussão entre Wang Bing e Ying Liang sobre a comparação entre o Novo Cinema de Taiwan e a brilhante 5ª geração da China, que desponta alguns anos depois do primeiro trabalho de Hsien.

No todo é um filme agradável e didático, embora o foco na expansão do cinema de Taiwan ao redor do globo (que se revela também uma forma de contornar o relativo descaso das massas locais para o seu próprio cinema) deixe pouco para saber sobre o próprio contexto onde foi produzido – para além de nunca pretender contornar um caráter demasiado apologético.

O melhor: agradável e didático, com muitos depoimentos interessantes
O pior: uma forma de organização pouco propensa a uma verdadeira troca de ideias sobre o tema


Roni Nunes

 

 

 

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