Sexta-feira, 26 Abril

«Quand Je ne Dors pas» por Roni Nunes

A maior curiosidade desta obra de Tommy Weber prende-se com uma leitura singular do mundo contemporâneo. Esta direciona-a mais para velhos arquétipos, como os da Hollywood da era dos estúdios ou do cinema francês dos anos 60 (impressão que o preto-e-branco também acentua) do que para um qualquer cáustico cinema autoral. A erosão da moral (o protagonista lida com drogas, mente e manipula) e as hipóteses narcísicas do “tudo-é-possível” dos tempos que correm estão presentes – mas apenas para justificar uma inversão de princípios onde a rudeza cede lugar ao ingénuo.

A ausência de cor impele o espectador para o processo de interiorização do personagem principal, um jovem de Paris sem rumo que elege como objetivo imediato viajar até ao mar. Mas, mesmo esse desejo simples, torna-se muito complicado por razões financeiras e Antoine (Aurélien Gabrielli) vai passar a noite “quando não dorme” do título a tentar viabilizar a sua empreitada – nem que para isso tenha de se tornar um dealer amador.

Neste movimento elíptico pela vida noturna da capital francesa, Weber nem conta uma verdadeira “história” (nunca fica claro porque é que Antoine decidiu viajar naquele dia nem o restante do seu background – com exceção da aparição do irmão) nem a abandona por completo – uma vez que o protagonista tem de facto um alvo a atingir.

Mas o que importa é que as perambulações de Antoine, um sujeito que nem é particularmente simpático, levam o espectador a um passeio pela classe média parisiense. E vem daqui o maior acerto da obra: evitando os extremos e um retrato unidimensional no vai-e-vem contínuo destas formas de vida e personalidades que surgem e desaparecem nas sombras, o cineasta encontra, no naturalismo, o ponto de sustentação do seu filme. O final é curioso, uma litania emocional em primeiro plano que deixa Quand Je ne Dors pas mais próximo do Romantismo assexuado do que da pós-modernidade cínica e hedonista.

O Melhor: o naturalismo e a boa composição dos personagens
O Pior: a opção duvidosa tomada à certa altura pelo monólogo sentimental


Roni Nunes

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