Sexta-feira, 29 Março

«Knight of Cups» (Cavaleiro de Copas) por Paulo Portugal

Quando se tem um nome como Terrence Malick a concurso num festival como Berlim é natural existir uma ajustada expetativa. Ainda que a exploração de um cinema etéreo, como se viu em A Essência do Amor tenha já relativizado uma confirmação do premiado A Árvore da Vida. Apesar do ADN de Malick lá estar, percebe-se também ao longo de Knight of Cups que o seu cinema começa a perder vitalidade na mesma medida em que a sua produção cresce em dimensão. Continua lá aquela centelha de cinema, a mensagem esotérica da procura da humanidade, mas de alguma forma, parece também que o seu estilo nos toca de uma forma mais distante. Como se nos sentíssemos agnósticos à sua ‘religião’…

Desta vez, as cartas de tarô que dividem o filme em inúmeros capítulos, como o cavaleiro do título, ainda que nem sempre possamos seguir o seu significado, encabeçado por Christian Bale no papel de Rick, uma celebridade a viver uma espécie de limbo criativo, muito provavelmente por se ter perdido numa espiral de fama e desaprendido a veia criativa através da teias das outras vedetas. Numa interpretação feita de presença física, quase sem diálogos, Bale evolui de festa em festa e de olhar vazio como que acentuando os excessos de Hollywood, em imagens de pura ostentação e decorativismo, onde não escapa até um Antonio Banderas a dançar dentro de uma piscina. Isto sempre com uma câmara distante que prossegue como um espírito uma viagem em redor das consciências humanas. Há também uma passagem para acentuar a catedral dos excessos em Las Vegas, mas também os momentos mais íntimos, como as desavenças familiares que tem com o pai (Brian Dennehy) e este com o filho (Wes Bentley). Neste desfile de personagens da sua vida, vemos também as diversas mulheres com quem esteve envolvido: Cate Blanchett interpretando uma cirurgiã que contacta com o mundo dos desafortunados, para além das presenças da belíssima australiana Isabel Lucas, a britânica Imogene Potts e até mesmo Natalie Portman, a confirmar o enorme magnetismo que o realizador esquivo tem sobre os atores.

Como tem sido recorrente nos filmes de Malick, os diálogos são mais em off, como sucede neste caso com o acompanhamento do timbre sempre pomposo Sir John Gielgud. Já a câmara etérea de Emmanuel Lubezki desliza e contempla as personagens, raramente nelas se fixando, frequentemente apenas em planos cortados.

Apesar de Malick conseguir em Knighrt of Cups alguns momentos de elevação, como uma espécie de consciência velada de uma Hollywood corrompida, vazia de ideias e onde apenas o lucro conta, acaba por nos deixar alguma sensação de vazio. Parece até um Malick mais focado em formular esboços de personagens com o seu habitual distanciamento. Em suma, empenha-se ao acentuar o peso visual da comunidade corporativa e materialista, mas acaba por ser vítima do mesmo vírus ao não evitar que o seu filme fique também, inevitavelmente, esvaziado de parte do seu interesse.

O melhor: Como é habitual, o sentimento espiritual que Malick coloca nas suas imagens é insuperável.
O pior: A perceção de que o realizador parece enredado num estilo vago que começa a deixar à vista algumas insuficiências.


Paulo Portugal

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