O documentarista suíço Fernand Melgar, filho de pais espanhóis, já é conhecido pelas suas obras que funcionam como uma espécie de consciência da sociedade Suíça, que aqui vê num espaço em Lausanne, que mais parece um bunker, o local onde durante a noite se recolhem os sem-abrigo para que não permaneçam ao relento.
Preferindo um estilo completamente observacional de câmara que vai filmando e sem qualquer intromissão do documentarista, muito pouco ficamos a saber sobre estes imigrantes e o que os levou até ali, sendo notório que a grande personagem aqui é o abrigo em si e as pessoas que o gerem, todas com muito coração, muita paciência mas também muitos defeitos. E por defeitos entenda-se que o espaço em questão não pode albergar todos os imigrantes que lá querem pernoitar, mas a forma como é feita a seleção (que faz lembrar a entrada para uma discoteca) vai contra uma sociedade que teoricamente procura dar a mesma hipótese a todos (um imigrante homem e solteiro tem muito menos hipóteses de dormir no espaço que uma mulher ou alguém casado, por exemplo). A burocracia evidente do local (onde até se adquire um programa para melhor gerir as entradas, em vez de se comprarem mais camas) mostra também um problema estrutural e de mentalidade da sociedade ocidental.
Esquecendo a questionável política do abrigo (que até é feita a certa altura por um seu funcionário) e voltando ao documentário, convém referir que Melgar filmou quase 180 horas de material, tendo posteriormente encurtado tudo para um filme abaixo das 2 horas que acima de tudo mostra a discrepância entre o sonho da emigração e a realidade da mesma.
E embora não traga nada de verdadeiramente novo, é sempre importante mostrar o quão discrepante é a situação dos nativos e dos imigrantes, principalmente depois da crise europeia que se abateu nos últimos anos, que provocou verdadeiras bolsas de pobreza e emigração.
Jorge Pereira
