Quinta-feira, 28 Março

«The Sound Before The Fury» por João Miranda

Attica foi um acontecimento marcante na história dos Estados Unidos. Se muitos de nós só ouviram falar dele pelos gritos de Pacino em Dog Day Afternoon (Um Dia de Cão), outros já terão ouvido pelo título do álbum e da canção Attica Blues de ,Archie Shepp. Em The Sound Before The Fury, título retirado de uma das várias comunicações efetuadas pelos presos de Attica durante o motim, junta-se a recriação desse álbum no seu quadragésimo aniversário com o recontar do que se passou nesses dias em que os prisioneiros ocuparam a prisão e do seu fim brutal.

Documentário de formato clássico, The Sound Before The Fury usa com cuidado o material de arquivo, sobrepondo às várias sessões que anteciparam o concerto de celebração do aniversário de Attica Blues, cartas e comunicações dos próprios presos, alguns testemunhos e imagens dos media. Podendo chamar-se competente, o filme falha em algo básico: as condições a que estavam sujeitos os presos em 1971 e que levaram ao motim, estão agora replicadas ou mesmo potenciadas, a um nível que nunca se imaginou possível. Qualquer estudo sobre o sistema prisional dos Estados Unidos mostra os problemas criados pela sua privatização e a institucionalização de novas formas de escravatura, bem como infracções óbvias aos direitos humanos. Ao reduzir-se ao passado e à música, este filme acaba por servir mal o Cinema e a sociedade em que foi feito. Bem sei, pode argumentar-se que nem sempre o cinema quer ser mais do que o pequeno tema em que se foca, mas se é mesmo assim, porquê fazer sequer um filme sobre Attica? Porquê falar da exploração e dos erros do passado e recusar uma ligação à actualidade? Há aqui uma leitura ideológica que se pode fazer, onde a falta de ambição dos realizadores parece ser, mais do que insuficiente, política. Talvez não seja consciente da sua parte, mas está lá. A vontade de evitar temas mais complexos ou mesmo a incapacidade de os reconhecer e/ou explorar acaba por mostrar o contexto sócio-político dos realizadores. Uma oportunidade perdida.

Quanto à descrição dos acontecimentos em Attica, uma leitura do artigo na Wikipédia mostra-se mais esclarecedora; quanto à música de Archie Shepp, vale sempre a pena.

O Melhor: Archie Shepp e a sua música.
O Pior: A oportunidade perdida.


João Miranda

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