Quinta-feira, 25 Abril

«Ciencias Naturales” por Hugo Gomes

Lila (Paula Hertzog) deseja conhecer o seu incógnito pai. Porém, a única pista para a sua identidade é uma placa soldada de uma empresa de instalação de antenas. Para piorar a situação, Lila, uma menina que atingiu recentemente a puberdade, vive na remota e por vezes hostil região de “Los Condores”, uma área montanhosa da Argentina.

Todo este cenário aqui apresentado a torna numa “marginal” no seu meio rural, principalmente acentuada nas aulas de ciências naturais dadas pela sua professora Jimena (Paola Barrientos), a qual explica a importância da fotossíntese no crescimento saudável de uma planta – e para tal é necessário esta ter contacto com diversos nutrientes e fatores. Ela sente-se como a semente ausente desses elementos, incapaz de crescer corretamente e impossibilitada de se tornar numa mulher de facto. Ou, pelo menos, é isso que Jimena defende ao tentar convencer a mãe dela a revelar a identidade do seu antigo “amante”. Mas os esforços são em vão. A compaixão da professora, no entanto, não a impede de ajudar a sua aluna e as duas, como cúmplices, decidem seguir numa viagem em busca do pai de Lila e, com pistas escassas, lançam-se ao desconhecido.

Esse mesmo desconhecido é a tour de force deste road movie com contornos do estilo coming-to-age. Ciencias Naturales, vencedor do Grande Prémio Generation Kplus no último Festival de Berlim, é um filme marcado por uma reverência consolidada, por um jeito meigo com que incute uma narrativa suave e afastada de qualquer frieza emocional. Aliás, como acontece com a personagem de Barrientos, é a compaixão que faz com que espectador acompanhe esta história, infelizmente contada e recontada um milhão de vezes. Mas a primeira longa-metragem de Matías Lucchesi, um confessado aficionado por road movies, incute os seus cenários como uma sinfonia em prol das emoções dos seus personagens, as montanhas de “Los Condores” como catalisador do estado de espírito de Lila ou o forno de uma oficina de serralharia como um caloroso sustento da revelação.

Mas convém salientar que este filme não funcionaria se a jovem actriz, Paula Hertzog, não fosse a verdadeira combustão emocional da fita. O seu desempenho é complementado com uma forte personagem que nos apresenta a maturidade, algo rebelde com certeza, num mundo que por vezes esquece das suas responsabilidades éticas. E, tal como Lila, Hertzog inerente e gradualmente cresce a olhos vistos no grande ecrã. O seu desenvolvimento, quer como personagem, quer como atriz, é encerrada com uma triunfante cena de emancipação, a libertação pessoal através da descoberta de nós próprios. Provavelmente, a maior de todas as aventuras deste Ciencias Naturales decorreu espiritualmente numa menina.

O melhor – Paula Hertzog
O pior – nada que fique na memória


Hugo Gomes

 

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