Sábado, 20 Abril

«Kreuzweg» (Estações da Cruz) por Paulo Portugal

Até à cerimónia de entrega dos prémios na Berlinale, em fevereiro passado, Stations of the Cross, estava entre os preferidos da crítica internacional. Haveria de ganhar o prémio do melhor argumento, co-assinado pelo realizador bávaro Dietrich e a sua irmã Anna Bruggermann. Fantástica a premissa de fundir a realidade e, sobretudo, a educação de um fundamentalismo católico de uma jovem na Alemanha de hoje, com as 13 estações da Via Sacra de Jesus Cristo. O resultado dividido entre outros tantos planos sequências fixos acompanhados por títulos da Via Sacra de Cristo não só ganha espessura formal, como recebe o melhor tratamento de uma admirável composição. Na verdade, sem essa solidez dramática, dificilmente estas Estações da Cruz nos levariam a quase esse êxtase de cinema.

Tudo começa com uma cena (admirável) de preparação do sacramento do crisma, onde um grupo de jovens adolescentes sentados a uma mesa, refletem com o padre sobre as virtudes das privações como uma forma de alcançar o divino e ao mesmo tempo contornar as tentações satânicas contidas no swing dos ritmos musicais, nos olhares furtivos dos membros do sexo oposto, da procura da beleza física. Maria tem 14 anos e vive essa realidade com afinco, até porque em casa recebe o mesmo incentivo pelo estilo de vida frugal patrocinado pela mãe. Nessa radical decisão estará o desejo de que esse sacrifício possa vir a curar o seu irmão de quatro anos que não chegou ainda a proferir uma palavra. Naturalmente, Maria acaba por assumir como objetivo dedicar o seu corpo a Deus, como derradeira forma de sublimar todas as tenções que vinha sentindo.

É claro que este percurso poderia da mesma forma encontrar as tradicionais ratoeiras a cineastas menos experimentados. No caso de Briggermann, percebe-se como o trabalho de três longas e várias curtas lhe permite percorrer essa Via com um surpreendente minimalismo e ironia que acaba por retirar ao filme uma carga melodramática excessiva.

O melhor: O rigor da concepção formal e a entrega da jovem Lea van Acken, como Maria
O pior: A réstia que lhe falta para a obra-prima


Paulo Portugal

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