Terça-feira, 23 Abril

«Party Girl» por Bernardo Lopes

Se o nosso percurso de vida foi repleto de escolhas invulgares e instintivas, onde o que reinou foram as sensações de efervescência e loucura, ao chegarmos àquela idade em que nos começamos a aperceber de que a festa está prestes a acabar, temos uma certa dificuldade em pousar o copo e deixar de acompanhar a música.

Angélique, protagonizada por Angélique Litzenburger, é uma mulher de 60 anos que trabalhou toda a sua vida como empregada de bar num bordel. Aquele ambiente está-lhe no sangue e (re)vive aquele espaço com uma saudade indescritível. Superior à vida, rege-se por viver cada momento como se esse momento nunca passasse, sobressaindo-se socialmente em relação aos que lhe são próximos e que bem lhe querem. Angélique espelha genuinamente uma geração de mulheres que, inevitavelmente, nos fazem lembrar Glória.

Quem melhor expressa a paixão por Angélique é Michel, um ex mineiro que a pede em casamento e luta por uma vida estável e cúmplice ao lado da irrefletida e extravagante mulher de Lorraine. Contudo, para quem viveu alucinantemente, não é fácil adaptar-se a um estilo de vida ténue e equilibrado. Até que ponto é que algum deles estará disposto a mudar drasticamente por amor?

Samuel, Mario e Severine, curiosamente usando também os seus nomes verdadeiros enquanto personagens, encontram-se sentados à mesa, com Cynthia, a filha que Angélique deu para adoção, mas que fez questão de estar presente, ao seu lado. Pela primeira vez, o coração daquela não sente que tudo faz sentido. Que apesar do caminho que cada um tenha tomado, o discurso que cada filho lhe faz vale cada segundo das decisões que outrora tomara.Ainda que se note falta de substância, é de salientar o ilustre trabalho criativo e conceptual desenvolvido por Marie Amachoukeli, Claire Burger e pelo também ator e filho de Litzenburger, Samuel Theis. Emocionalmente distinto dos retratos atuais, Party Girl merece ser destacado pela sua irreverência e atrevimento em representar uma geração de mulheres que muito têm feito estremecer o Festival de Cannes.

O melhor: Angélique Litzenburger e Samuel Theis
O pior: Por vezes, é notória alguma falta de substância e intensidade dramática.


Bernardo Lopes

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