Sexta-feira, 19 Abril

Festroia 2012: «Vegetarian Cannibal» (Canibal Vegetariano) por Jorge Pereira

 
Em 2009, Branko Schmidt levou aos festivais «Metastases», uma espécie de «Trainspotting» croata que se foca num grupo de amigos, todos fanáticos do futebol e do Dínamo de Zagreb, que vivem experiências diárias em torno do alcoolismo, das drogas, da pobreza, da violência e inevitavelmente do racismo numa Croácia pós guerra a lidar com diversos tumores sociais (daí as Metasteses).
 
Seguindo a linha desta obra, Schmidt apresenta agora «Canibal Vegetariano», uma espécie de continuação do relato de uma sociedade amoral e com ramificações cancerígenas em todas os seus sectores, sejam eles médicos, gangsters, polícias ou outras entidades. E mais uma vez, a fotografia desta Croácia está longe de ser a de um postal turístico. Schmidt é implacável, mas o que pode ser mais doloroso é ver um futuro sem grande esperança de mudança.
 
Em particular, e nesta história, acompanhamos Danko Babic (Rene Bitorajac, que volta a colaborar com o cineasta depois de «Metastases»), um ginecologista que trabalha numa das principais clinicas de fertilidade em Zagreb. Danko é uma personagem ambígua e profundamente hipócrita, alguém que não se alimenta de animais, mas que explora ao máximo – em seu proveito – os dramas e sofrimentos humanos, seja através de abortos ilegais que executa a prostitutas que trabalham para gangsters locais, seja a falsificar documentos de maneira a eliminar a concorrência na clínica ou mesmo a recorrer a métodos corruptos com policias, com quem troca favores.
 
«Canibal Vegetariano» é assim um filme duro, cruel, por vezes grotesco, enervante e certamente dissidente. E apesar de cercar os clichés e de os usar, Schmidt dá-lhes uma tal pessoalidade e enraizamento local que cria uma sensação de unicidade, fugindo do politicamente correto e mostrando uma realidade nua e crua, doa a quem doer. Obviamente que não se pode estender todo o contexto da obra como uma mensagem global sobre um país, mas estes «tumores», estas «metástases», estão localizadas e podem estender-se e destruir o corpo da nação croata se não foram combatidos a tempo.
 
Por isso, esta fita confirma a força e tendência de provocação social de Schmidt no seu cinema, ainda que por vezes as intenções saiam um pouco ao lado dos resultados pelo facilitismo com que apresenta as suas tentações.

O Melhor: É um filme sem papas na língua e sem frustrantes cortes impostos pelo politicamente correto
O Pior: Fora questões de qualidade, a sua ambição como concorrente ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro deve esbarrar no conservadorismo dos membros da academia
 
 
 Jorge Pereira
 
 

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