Sexta-feira, 26 Abril

O Grande Gatsby: a decadência dos loucos anos 20

Passados quase 90 anos da publicação da famosa obra de F. Scott Fitzgerald, o realizador Baz Luhrmann resolveu fazer uma nova adaptação (a quarta) do livro – mas muito fiel ao seu estilo barroco. A história gira em torno de uma misteriosa personagem da alta sociedade norte-americana dos anos 20 que se instala em Long Island, promovendo festas concorridas e nas quais nunca é visto. Por trás de tudo isso, uma trágica história de amor. Leonardo di Caprio como Gatsby, mais Carey Mulligan e Tobey McGuire completam o elenco principal.

Os loucos anos 20

Nos excessos dos anos 20, o estatuto de Gatsby simbolizava o apogeu da sociedade norte-americana da época. Uma posição inalcançável, megalómana, uma aproximação digna de Deus entre os mortais. Não é por menos que a personagem imaginada pelo autor norte-americano seja abordado como “Great” (Grande) no título da obra.

Publicado pela primeira vez em 1925 e declarado como a derradeira obra-prima do escritor, eis uma ácida crítica ao cinismo da alta sociedade dos anos 20. Neste livro Fitzgerald praticamente previu a Grande Depressão, período entre 1929 e 1935 no qual os EUA sofreriam com a acumulação e as consequências dos desfreados movimentos narcisistas que não olhavam a meios para as próprias limitações financeiras e sociais do país.

Assim sendo, a premonição deste evento catastrófico a nível social e económico dá-se com a queda do último “monarca” americano, Gatsby, que resume a eterna busca do chamado “sangue azul”. Porém, a personagem de Fitzgerald é muito mais do que um rico inconsequente: Gatsby é uma figura eternamente apaixonada, consumida pelo amor que sonha um dia possuir. Contudo, tal sentimento não pode ser adquirido com um simples cheque ou com a joia mais cintilante e é nesse contraditório materialismo que o mundo deste “Conde de Monte Cristo” norte-americano desaba, ao relance de qualquer um.

Aspirante a telefilme

Apesar de ser considerado um dos grandes romances do seculo XX, O Grande Gatsby não foi automaticamente popularizado e até se tornou desprezado durante o seu período de lançamento. Porém as morais e reflexos sociais transmitidos por Fitzgerald foram contagiando as gerações seguintes – que viam na personagem principal um exemplo alusivo da própria ambição dos EUA. Nos dias de hoje, a obra literária é uma das mais famosas, amadas e analisadas em todo o mundo, como também apetecida por teatro, televisão e, por fim, cinema.

Este último já conta com quatro adaptações, a primeiro dos quais um filme mudo de Herbert Brenon em 1926, com Warner Baxter no principal papel que, infelizmente, encontra-se perdido. A seguir surgiu a versão de 1949, de Elliott Nugent, com o célebre ator Alan Ladd no papel de Jay Gatsby. Mesmo não sendo uma obra conhecida e referenciada nos dias de hoje, é visto como um exemplo da idade de ouro pós-guerra de Hollywood. A versão mais famosa é a de 1974 – dirigida por Jack Clayton (The Innocents) e com Robert Redford e Mia Farrow nos papéis principais. Esta tornou-se a mais célebre e a mais bem-sucedida, apesar de mal recebida pelos críticos e hoje relembrada como um mero aspirante de telefilme.

As músicas e as cores de Baz Luhrmann 

Passados 39 anos, Baz Luhrmann, um eterno admirador de teatro e de shows musicais luxuosos, decide aventurar-se no romance de Fitzgerald e transmitir os excessos e as festas babilónicas que nunca haviam sido convertidas antes para o grande ecrã. Para tal o realizador de Moulin Rouge e Austrália teve ao seu dispor uma banda sonora composta por artistas mundialmente famosos, um luxo musical que poucos não invejariam, como se o próprio Gatsby os contratasse.

Na verdade, muito antes de o filme ter estreado nas salas e no Festival de Cannes, o qual figurou como sessão de abertura para um dos mais glamorosos eventos cinematográficos anuais, a coletânea de artistas e suas respetivas músicas faziam furor nas redes sociais. Entre os quais Lana Del Rey e o seu Young and Beautiful, descrito como o single principal da fita, uma balada de rock alternativo que conquistou a crítica e que tornou na jovem artista numa das mais cobiçadas e reveladoras do panorama musical. Baz Luhrmann utiliza em “The Great Gatsby” todo o seu estilo cinematograficamente técnico pelo qual é lembrado – conseguindo assim transcrever as intermináveis festas nos loucos anos 20 em plenos cabarets coreograficamente irrepreensíveis. A euforia arrebata tais sequências e Luhrmann codifica a verdadeira essência do onirismo do “sonho americano”.

Um trio de luxo

The Great Gatsby” pode muito bem ser, nos dias de hoje, um romance influente e com uma legião de admiradores próprios, mas a obra cinematográfica de Baz Luhrmann irá atrair um vasto público pelos seus atributos fílmicos, quer técnicos, musicais, visuais (eis um filme rodado em 3D) e até mesmo com base do seu elenco.

A quarta adaptação do livro marca o regresso de Leonardo Di Caprio sob a alçada de Luhrmann, 17 anos depois do considerável êxito de Romeo + Juliet, onde o autor transcreveu os escritos de William Shakespeare para os tempos modernos. O ator foi uma escolha instintiva no casting para o homónimo personagem, segundo o próprio realizador. O mesmo se pode referir de Tobey Maguire como Nick Carraway, o vizinho e talvez único amigo do protagonista.

 

Contudo as complicações deste ramo surgiram com a fundamental Daisy Buchanan, o “objeto” de cobiça e de afeto de Gatsby, papel ambicionado por atrizes como Amanda Seyfried, Keira Knightley e até Scarlett Johansson. Porém, durante o casting levado a cabo por Luhrmann, Carey Mulligan foi a selecionada. A jovem atriz de Shame, de Steve McQueen, e An Education, de Lone Scherfig (que lhe valeu uma nomeação ao Oscar) conseguiu desde cedo conquistar o realizador. Após a audição ele dirigiu-se a ela com um somente “bem-vindo ao Grande Gatsby”. Mulligan traz ao personagem algo ambígua do romance uma transposição de dualidade convincente e, acima de tudo, cativar os espectadores como uma derradeira figura que alude à transição de uma América inconsequente e ilusória para uma nação confiante, oportunista mas, acima de tudo, mazelada.

 

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