Segunda-feira, 29 Abril

«Party Girl» por André Gonçalves

No meio de tantos filmes que não sabem que história estão a contar, é refrescante assistir a um que saiba exatamente o que está a fazer.

Realizado a seis mãos (i.e. por uma tripla de realizadores!), Party Girl começou por gerar expetativa quando foi premiado no Festival de Cannes com a Câmara de Ouro, atribuída à melhor primeira longa-metragem.

Não sendo um filme facilmente categorizável de gay/lésbico/bissexual/transgénero – não há aliás uma única personagem aqui que tenhamos certeza que pertença a um dos quatro grupos acima! – é um filme definitivamente “queer”, pois esta história de uma sexagenária, trabalhadora de um bar noturno, que enfrenta o pesadelo de uma vida normal, após a proposta de casamento de um dos seus clientes mais habituais, é um dos retratos mais fascinantes vistos sobre o quão difícil é mudar o que somos em anos recentes.

Ao longo de hora e meia, acompanhamos Angélique e o seu mundo, a desmoronar-se com uma ameaça do que 90% das pessoas classificaria de uma reviravolta feliz – assentar, deixar de trabalhar, e casar-se com um homem que a ama. Mas nada é assim tão simples, como na vida. A iminência de deixar tudo o que soube para trás leva-nos com ela a uma viagem difícil, mas ultimamente honesta, tornada ainda mais honesta pelo facto destas pessoas estarem a representar… elas próprias e os realizadores fazerem também parte do grupo (é assim que se faz um docudrama, “Castanha“!)

Este é aquele raro filme que recusa categorizações e suplanta comparações aos seus predecessores (nomeadamente, e incontornavelmente, os irmãos Dardenne). Vamos torcer para que encontre a exposição devida.

O melhor: o realismo da história e das performances
O pior: é preciso ter disponibilidade para enfrentar esta realidade humana.


André Gonçalves

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