Quinta-feira, 18 Abril

Festa do Cinema Italiano: una Competizione molto, molto buona

Cinco filmes, cinco propostas imperdíveis. Em Lisboa, a Festa do Cinema Italiano decorre entre 4 e 12 de abril no cinema São Jorge e na Cinemateca. Dentro da programação, uma Competição poucas vezes tão coerente, tão entusiasmante.

Os italianos são, sobretudo, grandes contadores de histórias: há o humor subtil e irónico de Happy Winter (foto acima) ou a comicidade explícita de Easy; há uma poética incursão no mundo da fábula, seja através do realismo fantástico de cariz naturalista (Guarda in Alto) ou do artifício do mundo só de crianças de La Guerra dei Cafoni. Em Cuori Puri, muitas questões (religiosas, familiares, sociais) num drama intenso.

O C7nema dialogou com o diretor da Festa, Stefano Savio, sobre estas propostas…

Fugindo do mundo cinzento


Temos trabalhado no sentido de dividir as seções de forma mais clara”, diz. “Na Competição procuramos pequenas obras, novos realizadores e ideias de cinema diferenciadas. Aliás, temos mesmo três filmes que falam de juventude”.

Um deles é Guarda in Alto (foto acima), trabalho de estreia de Fulvio Risuleo estreado na seção Bright Future da última edição do Festival de Roterdão. “É um filme que imagina com grande liberdade e criatividade um mundo paralelo nos telhados de Roma, que abriga crianças e todos os adultos que ainda querem sonhar fora do mundo cinzento da realidade. É um mundo com regras próprias, com uma expressão orgânica onde tudo é possível. Neste sentido é otimista, diz ‘olha para cima’, é uma chamada de esperança“.


O fantástico e os mais pequenos retornam em La Guerra dei Cafoni (foto acima), um registo, todavia, muito diferente. A obra de Davide Barletti e Lorenzo Conte propõe uma reflexao sobre a forma de como a opressão e a miséria eternizam-se no comportamento social humano.

Cafoni é um termo italiano para ‘pobre, pouco educado’, e o filme apresenta uma história muito engraçada, uma luta entre bandos de crianças da Apulia, sul de Itália. Representa a estrutura do mundo através do olhar imaginário de uma criança e é muito preciso para ao descrever a realidade”, observa. Segundo ele, o filme foi feito com dialeto local e “até os italianos têm dificuldade em perceber o que é dito“.

Praias e nevascas


Das paisagens agrestes dos “cafonis” para as belezas naturais da Sicília. Happy Winter (foto acima) é um documentário encenado que ironiza um certo modo de vida da sociedade de Palermo. Explica o diretor da Festa: “O filme passa-se na praia de Mondello, perto de Palermo. Os habitantes da capital da Sicílica chegam a passar lá três meses e, facto insólito, transportam toda a sua vida para lá“.

E não trabalham? “Não!”, diz Stefano Savio. “Há bastante desemprego e as pessoas simplesmente mudam-se para lá, onde constróem pequenas estruturas de madeiras para habitar. O protagonista é um politico que está a fazer campanha. É um microcosmo que passa uma ideia festiva e ao mesmo tempo de estereotipo, como uma uma fotografia lindíssima. Será um dos grandes a nível de público“, acredita.


Do calor para um insólito “road movie” pelas terras geladas da Ucrânica. Easy (foto acima), de Andrea Magnani, trata de um protagonista depressivo, há 12 anos sem sair de casa, onde vive com a mãe. Num dado momento o irmão pede-lhe para entregar o cadáver (!) de um trabalhador ilegal que morreu nas obras no país do Leste. Um totó e um caixão são o ponto de partida para o momento mais assumidamente cómica da Competição. “É um filme muito simpático, que mistura leveza com alguma tristeza, uma combinação que funciona muito bem“.

Uma grande revelação

Eventualmente a construção mais complexa em termos de temas e imbróglios do enredo cabe a Cuori Puri (foto abaixo), de Roberto Paolis. Os “corações puros” do título cabem aos protagonistas – numa dinâmica já vista em La Ragazza del Mondo, uma das pérolas da Competição do ano passado: ela é uma jovem criada no ambiente protetor mas sufocante da religião; já ele não usufrui abrigo nem de nada nem de ninguém. Pelo meio ainda misturam-se temas de refugiados, ciganos, assistência social, trabalho voluntário. Não é pouco, mas um argumento escrito a quatro mãos dá conta do recado.


É o mais estruturado de todos”, avalia o diretor da Festa. “Fala de amor e de uma pessoa criada dentro de um universo fechado, o da religião católica. A protagonista quer promover um caminho de fé, mas apaixona-se por um rapaz que não tem nada a ver com o seu mundo. O filme foi uma grata revelação italiana no Festival de Cannes, um grande sucesso“, conclui.

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