Sexta-feira, 29 Março

Karoly Ujj Mészáros: «Acredito na democracia. Pena que não tenha sido equipada com meios de se proteger»


Fresco ainda do prémio para Melhor Argumento na edição de 2019 do Fantasporto, Karoly Ujj Mészáros arranjou tempo para dialogar com o c7nema a propósito de X – the eXploited, numa conversa que depressa se politizou, ou não fosse a sua obra um thriller político a decorrer numa Budapeste, que passou do comunismo para a extrema-direita no espaço de uma geração. 

A protagonista deste filme sofre de ataques de pânico derivados de stress pós-traumático. Como é que esta premissa teve início? Qual foi o “gatilho” que o fez explorar esta ideia? 

Queríamos fazer um filme sobre um herói, dado que não temos muitos. Noutras culturas, o heroísmo é essencial para as histórias: heróis de pequenas cidades, heróis maiores que a vida, super-heróis. Só temos anti-heróis aqui. Precisávamos de alguem com a mínima hipótese de se tornar um herói. 

Que tipo de pesquisa teve que fazer de modo a preencher esta personagem juntamente com o seu coargumentista? Conheceram alguém próximo do vosso círculo que pudesse sofrer da mesma condição, ou foi necessário pesquisar de forma a ser o mais verdadeiro possível para a história? 

Conhecíamos pessoas com problemas semelhantes e tivemos também uma terapeuta como consultora. Também tive alguns destes ataques quando era adolescente. 

Quando é que Mónika Balsai [atriz principal do filme] entrou na equação? Foi uma primeira escolha para o papel? 

De facto foi, sim. 

Este é um thriller político. O assassino deixa deliberadamente mensagens políticas a cada novo alvo. E testemunhamos até um vídeo de propaganda de extrema-direita durante um dos assassinatos. Qual a sua posição política face a esta ascenção do populismo, também considerando o que se está a passar atualmente na Hungria? Acredita que o cinema tem um papel importante em fazer com que pessoas que se autointitulem desligadas da política se comecem a importar?

Este é um período infeliz na história política por todo o mundo. Alguns dizem que é pela queda da ordem mundial – expressa no dualismo capitalista/comunista – que esteve dominante no pós-Segunda Guerra Mundial. Outros dirão que é pela ascensão das redes sociais online como meio fácil de manipulação.

De qualquer das maneiras, acredito na democracia. Pena que esta não tenha sido equipada com meios de se proteger. Além disso, à democracia faltam algumas das reformas essenciais que deixariam os votantes menos satisfeitos que são o alvo da manipulação. O filme Brexit foi realmente interessante como exemplo, para mostrar como o status quo falha à medida que estas massas parecem encontrar um caminho falso de expressar a sua raiva. 

Insiste em mostrar uma Budapeste de pernas para o ar durante muitas das transições desta obra. Foi esta repetição uma maneira de refletir sobre o próprio mundo virado do avesso da protagonista?

Sim. Além disso, refere-se também à mudança da ordem mundial existente – até a gravidade funciona de “pernas para o ar”. 

Pode dizer-nos algo sobre o que está para vir? Algum projeto entretanto confirmado? Quais são os seus planos? 

Gravámos uma série em oito episódios com a Móni[ka] Balsai novamente no papel de protagonista, e estou atualmente a trabalhar na pós-produção desta obra. Estou aliás a escrever as minhas respostas na sala de montagem. É uma obra com 400 minutos, o que equivale a 4 longas-metragens em termos de duração. 

Não tenho a certeza sobre qual será a minha próxima longa-metragem. 

Qual é a importância do filme ser selecionado por um festival como o Fantasporto?

É sempre ótimo ser selecionado para qualquer festival. O filme foi bem recebido no Porto. O prémio que recebemos prova isso. É, para além disso, boas notícias para o Hungarian Filmfund [fundo para a sétima arte, que financiou este filme] e para os nossos fãs locais. 

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