Domingo, 28 Abril

«Gelo»: entrevista com Gonçalo Galvão Teles

As vidas de duas mulheres cruzam-se de forma inesperada. Concebida a partir do ADN de um cadáver congelado com mais de 20.000 anos, Catarina cresce encerrada num palácio isolado, sob a tutela de Samuel, um investigador que a usa como cobaia num projeto sobre a imortalidade humana. Joana, uma jovem estudante de cinema, apaixona-se por Miguel, um colega mais velho obcecado pelo Gelo, paixão que acaba súbita e tragicamente durante uma viagem iniciática ao cume de uma montanha nevada.

O filme que abre hoje o Fantasporto é português – Gelo vem realizador por Gonçalo e Luís Galvão Teles, pai e filho respetivamente, mentores da Fado Filmes e responsáveis por filmes como Tudo Isto é Fado, Dot.Com ou a curta-metragem Senhor X. O elenco conta com a espanhola Ivana Baquero, José Afonso Pimentel, Albano Jerónimo, Ivo Canelas, Ruth Gabriel, Carlos Santos e Inês Castel-Branco.

Gelo é exibido hoje no Fantasporto (na sala grande do Rivoli) e estreia nos cinemas nacionais a 3 de março.

O c7nema falou com Gonçalo Galvão Teles a propósito da estreia no festival portuense.

Como surgiu a ideia de fazer Gelo?

Tudo partiu de um argumento original que o Luís Diogo me deu a ler, há mais de dez anos. A construção narrativa era significativamente diferente, mas o coração da história mantém-se o mesmo. Na altura atraiu-me imediatamente o ponto de partida: um grupo de jovens estudantes de cinema a escrever e discutir os seus argumentos, que depois se iam materializando em histórias aparentemente reais. Ainda por cima tudo se passava na Universidade do Sul da Califórnia, onde eu poucos anos antes tinha concluído o Mestrado em Escrita de argumento e vivido exactamente as situações que os personagens estavam a viver.

Depois partilhei o argumento com o meu pai, que ficou mais atraído pela segunda parte da história, que lida com as questões da imortalidade, da preservação da vida depois da morte, do que ficará de nós depois de partirmos.

Estávamos longe de imaginar que anos mais tarde, muitos anos mais tarde, acabaríamos por realizar o filme juntos – o que acabou por acontecer naturalmente, a partir das ligações, diversas mas umbilicais, que ambos tínhamos com o argumento.

Como foi correalizar um filme, ainda mais, como pai e filho?

Nem sempre fácil, muito menos vezes difícil, a partir da ligação umbilical acima descrita e norteada por três elementos fundamentais: o mais importante é o filme, respeito mútuo e saber ouvir-nos um ao outro, debater as questões profundamente na construção de uma dialéctica que assegurasse que estivéssemos permanentemente a “ver o mesmo filme”: nenhum de nós pode reclamar autoria sobre o que quer que seja, porque tudo foi verdadeiramente construído em conjunto.

E depois são já muito anos de convivência profissional, às vezes mais próxima outras mais afastada e com projectos individuais, a que nada se pode sobrepor. À família nada se pode sobrepor.

Tem vontade de fazer mais filmes neste registo de ficção científica?

Não somos nós que escolhemos os filmes, são os filmes que nos escolhem a nós. Antes do Gelo não me imaginava a fazê-lo, agora fico à espera que o futuro, seja ele de ficção científica ou não, decida por mim.

O Luís já tinha trabalhado estes domínios n’ A Confederação, o seu primeiro filme. A seguir regressará à comédia com os Refrigerantes, que vai começar a rodar já em abril. Depois logo se verá.

Como foi trabalhar com a jovem Ivana Baquero?

Um filme é uma sucessão de compromissos com a realidade, na esperança de que no final o resultado supere tudo aquilo que se tinha imaginado. Se a presença de uma atriz espanhola começou por ser uma imposição de coprodução, neste momento o filme e a Ivana são indissociáveis.

Hoje é impossível imaginar qualquer outra pessoa no seu papel. A Ivana é um talento puro, brutal, fruto de um trabalho profundo em cada personagem que disfarça com uma aparente simplicidade e espontaneidade que nos desarma a cada momento – no plateau e no ecrã. E de uma humildade extrema que torna o trabalho do(s) realizador(es) um fácil prazer.

O que esperam da estreia do filme esta semana no Fantasporto?

Que seja o princípio de uma carreira bonita para o filme, em que este consiga chegar e tocar as pessoas que o queiram ver – e em que cada espectador escreva a sua própria história, porque, como diz a Ivana no filme, o mais importante é cada um escrever a história que quer contar.

Além de ser um festival com uma tradição mítica no cinema fantástico, o Fantasporto faz também parte da história da Ivana Baquero, que se estreou no cinema com 12 anos no Labirinto do Fauno de Guillermo Del Toro, vencedor do grande prémio do festival em 2007. Nesse sentido esta estreia é também um regresso a casa, um tema que Gelo simbolicamente aborda.

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