Sábado, 20 Abril

Entrevista a Károly Ujj Mészáros, o realizador de «Liza, the Fox-Fairy»

 

Liza, the Fox-Fairy foi o vencedor do Grande Prémio do Fantasporto, mas antes de sabermos que o filme iria conquistar o principal prémio, tivemos a oportunidade de falar com Károly Ujj Mészáros, um cineasta húngaro, já com dez curtas-metragens na bagagem, que nos explicou como nasceu o projeto e quão difícil foi levá-lo aos cinemas.

Aqui ficam as suas palavras:

Antes do Liza, the Fox-Fairy, realizou seis curtas-metragens. Quão difícil foi a transição das curtas para as longas-metragens?

Na verdade fiz dez curtas-metragens antes da Liza. Uma longa-metragem é realmente outro nível. Descobri logo isso na fase em que escrevia o guião. As longas são criaturas gigantescas comparadas com as curtas, é como construir uma pequena cabana e depois uma catedral. A estrutura é muito mais importante de maneira a evitar que a construção desabe. O mesmo aplica-se na montagem; uma longa-metragem é uma enorme besta com as suas próprias regras e nunca temos noção da diferença até realmente trabalharmos nela. No entanto, adorei cada minuto que passei a trabalhar no filme.

Budapeste parece um sitio estranho para descobrir uma criatura do folclore japonês. Como nasceu a ideia para a Liza e como foi o processo de transformar essa ideia num filme?

O filme era originalmente baseado numa peça de teatro, que era muito absurda, do estilo estranho à [Eugène] Ionesco. Mas não tinha nada de japonês. Isso veio depois uma adaptação muito livre da peça. Descobri o conto das fadas-raposas em Nasu, enquanto participava num festival de curtas-metragens no Japão, em 2006. As fadas-raposas entraram na história e tomaram conta dela.

Depois do Womb, do Benedek Fliegauf, em 2008, o seu filme foi o segundo projeto húngaro a ser escolhido para o famoso Atelier da Cinefondation. Como foi essa experiência em Cannes?

Foi ótima. O Atelier em Cannes foi a terceira plataforma de desenvolvimento que convidou a Liza, isto depois de Sarajevo e dos Encontros Cinematográficos da Holanda (em Utrecht). Cannes foi muito instrutivo e profissional. Em cada dez filmes apresentados no evento, oito são efetivamente realizados. Nós tivemos a sorte de estar nesses 80%.

Foi difícil completar o financiamento da obra?

Foi horrivelmente dificil. Nós tivemos muito perto de conseguir todo o orçamento quando o financiamento cinematográfico húngaro (Hungarian Film Fund) foi completamente reorganizado. Estivemos ano e meio parados por causa disso. Depois fomos os primeiros a ser financiados [nesta nova vaga] pelo  Hungarian Film Fund. Mais tarde, os nossos co-produtores dinamarqueses e alemães não conseguiram nenhum dinheiro dos fundos para o cinema dos dois países, por isso tivemos de pedir um financiamento extra ao nosso fundo e ao produtor Istvan Major. Para além disso temos também um financiamento privado. Foram precisos 5 anos para juntar o dinheiro antes de começar a filmar.

Quando vi a cenografia do Liza lembrei-me de alguns dos trabalhos do Jean Pierre Jeunet. Que filmes e cineastas o inspiraram e serviram como pontos de referência para o filme?

Bem, eu gosto muito do Jeunet pelo seu tom divertido. Porém, não tivemos os seus filmes em mente quando planeamos a estética. O Liza é mais negro e menos colorido que qualquer dos seus filmes. O humor no nosso filme é mais seco e amargo. Não quis nada simplesmente doce. Mesmo nas cenas emocionais existe um sentido de humor oculto. Nas cenas engraçadas, podemos sentir alguma tristeza. Eu queria este tipo de ambiguidade emocional. Thomas Anders Jenssen, Bent Hamer, Roy Andersson, Aki Kaurismäki podiam ser as minhas maiores inspirações, mas também posso nomear três cineastas húngaros: Zoltan Fabri, Peter Bacso e Peter Gothar.

Que pode a audiência do Fantasporto esperar do seu filme e até que ponto é importante a presença da Liza no programa do certame?

A exibição já decorreu e os portugueses parece que gostaram. Riram muito e vi um sorrisos nos seus rostos após o último visionamento. Muitos cineastas que admiro ganharam o principal prémio no Fantasporto, por isso foi uma grande honra estar lá. Também adorei a cidade, foi a minha segunda vez lá e foi ótimo comer carne de vitela com feijão, 19 anos depois.

Existiram algumas reformas no sistema de financiamento na Hungria que originaram protestos de vários cineastas. Como está agora a situação relativamente a esses fundos?

Isso aconteceu em 2010-2011. É difícil descrever a situação numa frase curta. Têm existido longos debates em vários artigos com cineastas e produtores muito mais experientes que eu. É um assunto complicado. Algumas pessoas acham que foi uma benção, outras exatamente o oposto. É verdade que a comunidade cinematográfica da Hungria esteve dividida após essas mudanças. Mas parece que agora cada vez mais e mais realizadores e produtores tendem a aceitar bem o sistema e demonstram interesse em se candidatar aos fundos. Alguns produtores chave admitiram resultados positivos com o novo sistema, um dos quais vai brevemente trabalhar comigo no meu novo projeto. O ano passado foi um ano muito bom para o cinema húngaro, liderado pelo Kornél Mundruczó que teve uma história muito sucedida com o White God, o qual vai ter brevemente a sua estreia nos EUA. Mas uma coisa é ter o seu filme financiado, outra é o que vamos dizer com esse filme à comunidade que nos financiou a obra.

Tem algum novo projeto em mente, algo em que esteja já a trabalhar?

Bem, sim. Mas sou muito supersticioso para falar disso. Adorava fazer uma história criminal muito inteligente e excitante e que tenha muitas fatalidades. Ainda mais que na Liza. Mas de momento não posso adiantar mais.

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