Terça-feira, 23 Abril

Josh Hutcherson: «as vezes gostaria de poder viver uma vida normal e isso não é possível»


Josh Hutcherson a chegar a San Sebastián

As imediações do teatro Victoria Eugenia, em San Sebastián, estavam completamente barricadas por uma mole humana, maioritariamente feminina e adolescente, que gritava e tentava a todo o curso erguer-se para poder ver melhor. À distância, a figura alvo de toda a atenção mal se distinguia, o que não impedia que os milhares de smartphones fizessem em seu redor uma moldura cintilante.

Aparentemente pouco perturbado com tal histeria, o americano Josh Hutcherson lá ia distribuindo sorrisos, tocando mãos alheias e posando ocasionalmente para selfies. Mas mesmo as fãs que se contentavam com fotos à distância choravam convulsivamente para o ecrã diante da sua nova relíquia. Assim fala o mais recente fenómeno mediático da juventude, gerado pela histeria em redor da franquia Hunger Games. Sobretudo agora que a adaptação dos romances de Suzanne Collins entra na derradeira fase, com A Revolta – Parte 1.

Já na sala, Josh era recebido por um enorme turbilhão ao escutar o seu nome. De resto um nome que os fãs confundem com o da personagem de Peeta Mellark, a tal personagem que divide o protagonismo da saga com Jennifer Lawrence. Juntos são responsáveis por terem elevaram à estratosfera uma franchise baseada num mega reality show onde os habitantes da realidade distópica chamada Panem e presidida por um Snow (Donald Sutherland) lutam até à morte como gladiadores para o gozo da avançada elite da Capital, de resto, um pouco no estilo do original japonês Battle Royale. Nesta aventura final já não teremos jogos mas sim os ventos de mudança de uma revolta popular promovida por Alma Coin (Julianne Moore) e Plutharch (um dos derradeiros papéis de Philips Seympour Hoffman) para derrubar o regime totalitário.

Em novembro próximo com a chegada da Parte 2 acabarão os Jogos da Fome, será que irá terminar a histeria em redor das suas maiores estrelas? Foi precisamente por aí que quisemos iniciar a nossa conversa…

Como reage a todo este fascínio e histeria em seu redor? É algo com que já lida com alguma naturalidade?

Não, não é normal. É como um circo, nunca me irei habituar. É uma loucura! Não sei como descrever. É estranho mas ao mesmo tempo é algo bonito, pois estas pessoas criam laços connosco, com o nosso trabalho, com os nossos filmes.

É que eu vi adolescentes pendurados com o telemóvel ao alto e um ar de delírio, só para poderem tentar tirar uma foto desfocada de si…

(risos) Pois, ficam excitadas só por nos verem, por poderem tirar uma fotografia. E frequentemente choram. Veja bem, perceber que temos um efeito como esse nas pessoas é incrível; fazer alguém feliz apenas por dizer ‘olá’ é muito poderoso. Mas também é algo intimidante e intenso, porque é algo que nos persegue por todo o lado.

Como reage ao ver o efeito que a sua cara tem nestes adolescentes?

É a minha cara, não posso mudá-la. Às vezes gostaria de poder viver uma vida normal e isso não é possível.

Mas não que esteja arrependido, presumo (risos)…

Não, não, não… Percebo que faz parte do trabalho. Não trocaria isto por nada. Dou apenas graças a Deus que as coisas me estejam a correr tão bem no meu trabalho como ator.

Na verdade, o Josh não é apenas um ator, é também uma celebridade. Como avalia esse fascínio pelas celebridades que afinal de contas não é novo, existe desde os primórdios do cinema?

Sim, só que nessa altura não havia twitter… (risos) Mas quem me dera ter sido um ator, digamos, há trinta ou quarenta anos atrás. Ou mesmo no período clássico do cinema americano, nos anos 40 ou 30. Isto porque onde quer que vamos as pessoas irão sempre tirar uma foto com o seu smartphone, colocá-la online e dizer onde estamos fazendo com que toda a gente apareça. Por vezes não consigo perceber como os paparazzi conseguem aparecer nos locais mais incríveis. Isso só porque alguém tirou uma foto e colocou no twitter a dizer que estava no aeroporto. Ou seja, nunca me posso perder porque alguém irá sempre encontrar-me. Fico doido com isso. Vivemos numa sociedade dominada pelas redes sociais.

Poderemos dizer que faz parte do trabalho?

Eu sei que faz parte do trabalho, mas não deveria ser assim. Comecei a trabalhar quando tinha apenas nove anos, porque tinha esse desejo. Só não percebo quando as pessoas me dizem que a perda da privacidade vem com o trabalho.

Isso significa que não é um utilizador de redes sociais?

Não, apenas uso o meu twitter para aspetos publicitários relacionados com o meu trabalho. Do ponto de vista pessoal não. Aliás, odeio como hoje me dias as pessoas comunicam. Ok, mas não me compreenda mal. Acho que o twitter e o facebook são excelentes ferramentas para dar voz a quem não tem uma voz. Só que isso é perigoso. Há países que passam por crises graves e as pessoas podem partilhar as suas histórias, o que é ótimo. Só que muita gente também usa também as redes sociais para coisas negativas, como para fazer bullying que é algo que sou totalmente contra. De resto foi algo que experienciei eu próprio mão e com amigos meus. Apesar de tornar o mundo mais ligado, acaba por desligar mais as pessoas umas das outras.

É verdade que teve problemas com bullying?

Digamos que tenho uma campanha ativa contra essas pessoas que fazem bullying. Por acaso não andei no liceu, tive aulas em casa, mas estou familiarizado com as experiências que muitos rapazes e raparigas passam. Isso pode ser um inferno. Acho que chegou a hora das pessoas falarem.

Sente que hoje em dia com o seu estatuto de celebridade tem a oportunidade de escolher melhor os seus papéis, aquilo que lhe dá mais gozo fazer?

Acho que sim. Procuro escolher o tipo de projeto, seja pela dimensão ou o estúdio, pela relevância da história, conteúdo ou o realizador. Como sucedeu por exemplo com o filme Escobar, pois fiquei fascinado pela história, com a possibilidade de trabalhar com o Benicio (Del Toro). Mas é verdade que também gosto de correr riscos.

A verdade é que foi a franchise Hunger Games/Jogos da Fome que criou esse monstro… (risos) Acha que depois desta série, a sua vida poderá regressar à normalidade?

Espero que sim. Vamos ver o que se passa. É verdade que os fãs são muito envolvidos no projeto. Mas na verdade até espero que alguns me possam seguir para outros projetos que venha a fazer, apesar de desejar também que toda esta euforia possa também acalmar-se um pouco.

No fundo parece que a fama acaba por referir-se a uma personalidade, que não é você necessariamente, mas a uma ideia de você…

Sim, está relacionada mais com alguma personagem que criei. É ela que muitas vezes pretendem ver.

Gosta de ir ao cinema? Diga lá, é capaz de ir ao cinema sem ter de entrar depois do filme começar e sair antes de acabar?…

(risos)… Não é bem assim. Nem tudo é assim tão limitado. É claro quando estou num evento publicitário, como aqui, tudo se torna muito mais louco. Mas quando vou ao cinema, podem cumprimentar-me, mas nunca como esta histeria. E claro que adoro ir ao cinema. Eu acabo por viver uma vida normal, faço coisas normais. Pode haver um ou outro caso mais exagerado aqui e ali, quando alguém ultrapassa os limites. Digamos que consigo manter a minha postura discreta.

Não receia que a sua vida possa seguir um rumo diferente, como sucede a tantas estrelas após perderem a sua fama? Está seguro sobre aquilo que quer fazer e aquilo que nunca irá fazer em termos de decisões de vida?

Às vezes muita gente perde o rumo daquilo que fazem, de onde vêm e de onde estão e a razão porque estão ali. Felizmente tenho muitas pessoas boas ao meu redor, a minha família, amigos e até alguns casos de pessoas que seguram caminhos maus, mas por vezes por não terem esse grupo de apoio em seu redor e acabam por ser vítimas da sua própria fama. Mas não é isso que eu quero fazer. Sou um ator porque quero contar histórias. E levo isso muto a sério: quero produzir, quero realizar. Por isso estou focado no meu trabalho. Mas também divertir-me um pouco pelo caminho, porque não?.. (risos)

Disse que começou muito cedo. Relate um pouco esse trajeto, as dificuldades que teve. O seu sonho aos nove anos de idade era mesmo ser ator?

É verdade. Acho que a vida tem muito a ver com a sorte, pois parece que estava no local certo na hora certa. E, claro, também terei o meu talento. Mas as coisas boas ou más acontecem por alguma razão. Tive sorte de poder trabalhar com atores e realizadores incríveis e até desenvolver o meu próprio método, como queira chamar-lhe. Tive sorte, é verdade, mas também muita determinação.

Foi difícil convencer os seus pais a seguir este rumo?

Por alguma razão consegui convencê-los a seguirem-me nesta aventura louca de ser um ator. Acho que tive sorte. A minha mãe abandonou o trabalho apostou em mim ao ir comigo de Kentucky para Los Angeles. Nessa altura, os meus pais não tinham muito dinheiro e o cartão de crédito estava usado no máximo. Por exemplo, o meu pai trabalhava numa agência de proteção ambiental do governo. Nessa altura, a minha mãe disse-me: “tens seis meses para fazer esta tentativa. Se não resultar voltamos para casa. Vais para a escola e tentas depois quando fores mais velho“.

Felizmente agora pode retribuir todo esse investimento que fizeram em si…

Sim, o melhor que me pode acontecer hoje é mesmo ajudar aqueles que me ajudaram tanto quando estava a crescer, podendo comprar uma casa para a minha mãe ou um carro para o meu pai.

A sua tatuagem no pulso tem um significado especial?

Sim, é um desenho do signo balança. Tenho-a desde os dezasseis anos. As outras são estrelas, para a minha mãe, o meu irmão e o meu pai. No fundo, elementos relativos à minha família e àquilo que eu sou.

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