Sexta-feira, 29 Março

Entrevista a Andrew Garfield, o Fantástico Homem-Aranha

“Sem bulying não seria o Homem-Aranha”

Conhecemos em Paris o homem que vive debaixo do fato de licra de Homem –Aranha. O anglo-americano que revelou que o seu super-poder residiu, na verdade, por ter sido molestado por bullying quando andava na descola. Acabou por ser o super-poder que lhe permite ser um dos atores mais em demanda. Nem de propósito, a seguir, irá ser o sacerdote jesuíta português, Sebastião Rodrigues, no filme de Martin Scorsese, O Silêncio.

Estivemos agora mesmo com a Emma e ela falou muito bem de si. Espero que seja recíproco… (risos)

Mas que bem! Não, ela é uma atriz incrível, como bem sabemos. É o que eu chamo um talento singular. Por isso estou muito contente por estar no cast com ela. Bem como com o Jamie (Foxx) o Dane (DeHaan). É um cast excelente, atores fenomenais.

A verdade é que se sente entre ambos uma boa vibração...

Talvez porque tentemos não representar. E o melhor é ter atores connosco que desejem o mesmo tipo de aproximação. Foi o que aconteceu, com a Emma, o Dane, o Jamie, a Sally Field, todos queriam esquecer-se que estavam a representar para uma câmara. Para mim é essa a intenção quando represento.

Quando começou esta viagem esperava que fosse assim tão bom?

Claro que sim. Mas eu sou assim com tudo. Nós esperamos sempre ter as melhores experiências, mas nunca sabemos. Mas aconteceu que neste filme criámos uma autêntica família. Sobretudo quando temos já um filme atrás de nós, com dinâmicas criadas. É algo que vamos casando.

O Homem Aranha lida muito com a esperança. O que lhe dá a si esperança quando precisa?

Sim, acho que ando sempre à procura de esperança (risos).

Acha que precisa mesmo dela?

Claro que sim. Todos precisamos. Se não o que andamos cá a fazer? Qual é o mistério da vida? Há demasiadas perguntas sem resposta, por isso acho que devemos tentar encontrar. Eu procuro esperança na natureza, na História, em cada pessoa que encontro, nos filmes. Em geral, na Arte.

Depois de Homem-Aranha espera-o a batina do sacerdote português que irá vestir no filme de Martin Scorsese, ‘O Silêncio’. Acha que é algo que toca naquilo que estava a dizer?

Sim, trata-se de um projeto muito interessante. No fundo, uma conversa entre um deles com Deus. Em que Deus é o ente silencioso. Essa é a grande questão existencialista. Vai ser muito interessante mergulhar nesse tipo de território.

O que acha desta expetativa de trabalhar com o Scorsese. Acha uma figura assustadora?

Não, de todo. Todos sabemos como ele consegue retirar grandes performances e como consegue inspirar todos os atores que trabalham com ele. Foi uma oportunidade imperdível.

O que descobriu sobre este sacerdote português. É que em Portugal não é uma história muito conhecida. O que foi que mais o fascinou nesta personagem?

A verdade é que ainda não fiz essa pesquisa. Só iremos começar a filmar no inverno. Mas estou entusiasmado com essa expectativa. E, para já, o Sr. Scorsese enviou-me três caixas de material para pesquisa. Por isso terei muito para pesquisar: filmes, livros, fotografias, imagens… Terei muito que fazer.

Sente que ‘O Silêncio’ será o seu filme mais negro?

Sim, acho que ‘O Silêncio’ será o mais negro de todos, sim. Em que o Homem está à deriva.

Tenho estado a ouvi-lo e sinto que o Andrew está muito mais maduro de quando era apenas um novo miúdo inglês acabado de chegar a Hollywood. Terá sido o facto de ter completado 30 anos?

(risos) Acho que nunca fui um novo miúdo em Hollywood a gozar a vida. Isso não sou eu. Pode ter sido uma representação de algum jornalista. Sempre fui assim.

Talvez fosse algo que tivesse a ver com alguma excitação…

Isso sim, completamente. Eu sinto essa excitação, porque gosto demasiado daquilo que faço. Nesse sentido sinto-me privilegiado por fazer o que faço. Mas, por outro lado, a responsabilidade de quem conta histórias é questionar-se sobre as grandes questões. Se não nos questionar-mos nós próprios, como poderemos ser credíveis naquilo que fazemos?

Mesmo que seja metade americano, sente que em essência é um “brit”?

Sinto-me ambas as coisas. Acho que sou americano e inglês. Adoro poder ser ambas as coisas. É uma combinação feliz.

Como descreveria essa dualidade?

Por um lado, sinto aquela contenção natural britânica; mas, por outro, aquela reação expressiva tipicamente americana. Talvez por termos mais espaço nos EUA. E o sol da costa oeste. Sinto-me afortunado por poder beneficiar de ambas as experiências.

Ainda, imagino, para si o futebol seja algo que apenas se joga com os pés…

(risos) Sim, claro. O futebol americano não faz qualquer sentido. Não compreendo como os deixaram levar essa avante.

Tem algum clube favorito?

Gosto de jogar, mas não sigo uma equipa em particular. Não pertenço a esse tribalismo.

E alguns planos para voltar a trabalhar no cinema britânico?

Sem dúvida. Aliás, até porque em Inglaterra me sinto mais em casa do que na América. Mas não é nada que faça parte de um plano.

Voltando ao Homem Aranha, até que ponto esse fato é sagrado para si? Deixaram-no levá-lo para casa?

Sim, por acaso tenho um na minha bagagem. Viaja sempre comigo. Mas só o uso em ocasiões especiais. Mas, sim, é algo que é sagrado para mim. É um ícone.

Gostava de lhe fazer uma pergunta mais pessoal. Espero que não se importe. Quando era mais jovem teve algumas problemas de bullying, algo que afeta muitas crianças hoje em dia. O que lhes diria?

Dir-lhes-ia que não estão sozinhos, pois é algo que acontece com frequência. Dir-lhes-ia que devem falar sobre isso. Estou a pensar o que eu precisava de ouvir quando precisava de ajuda. Mas acho que o que precisava de ouvir era que a pessoas que nos está a fazer sentir mal não quer dizer que sejamos aquilo que ela diz. O que acontece frequentemente é que a pessoa que faz bullying está de alguma forma perturbada também. Ela também não gosta da sua vida, por isso vinga-se nos outros. Na altura não percebi isso, apenas achava que havia algo errado comigo. É algo que deve ser conversado com os pais. Mas a criança deverá poder trazer isso aos pais. E eles deverão saber escutar.

De que forma isso o modificou depois de ter superado esse trauma?

O bullying é algo que segue connosco. Porque é poderoso, encerra muita energia. Mas as nossas feridas acabam por ser as grandes dádivas. Por isso, eu estou bastante agradecido ao jovem que me fez essa tortura na escola. Sem esse bulying não seria o Spider-Man. E não estaria a falar consigo. Nesse sentido, a ferida foi a dádiva. Estou muito agradecido por isso.

Sentiu que, de certa forma, isso lhe permitiu explorar a sua criatividade?

Seguramente, porque fui alvo de bullying por ser sensível e por ser magricela. E por mostrar sentimentos.

Pelo menos já não é magricela…

(Risos) Ainda sou magrito, pelo menos quando não vou ao ginásio. Mas hoje celebro isso. Fui torturado por ser sensível, quase de uma forma feminina. É isso que eu acho que agora me ajuda muito. Permite-me ser ator. Posso usar todas essas qualidades no meu trabalho.

Quase como um super-poder, não?

Exato, o poder de ser sensitivo e de ter compaixão, empatia.

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