Sexta-feira, 26 Abril

Córtex: Entrevista a Hugo Pedro, realizador da curta metragem «Primária»

Primária foi a grande surpresa do Córtex ao arrecadar o Prémio do Júri e também o do Público. O C7nema teve a oportunidade de falar com Hugo Pedro, o realizador desta curta-metragem.

A tua curta já tinha sido preterida em outros festivais (e.g. Doc Lisboa). O facto de, após teres sido “rejeitado”, teres ganho os dois prémios no Córtex, deu-te um gozo especial?

Até à altura do Córtex o Primária ainda só tinha sido enviado para o DocLisboa, e de facto não foi considerado. Mas foi o único festival até agora a fazê-lo, sendo que o filme ainda nem sequer estava pronto na altura do Indie. Naturalmente fiquei um pouco desapontado com o facto do Primária não poder ser exibido no contexto do Doc, porque acreditava que ele tinha algum mérito, mas penso que a desconsideração deve estar mais relacionada com diferenças de abordagem. Acabei por pensar que isso poderia ter a ver com o facto do Primária parecer (aparentemente) não ter qualquer investimento político, ou experimental, ou não procurar estar auto-consciente do cinema, ou ser demasiado sobre sentimentos. Não sei. Foi esta a crítica que me coloquei depois de saber que o filme não tinha entrado, ainda que tenha pensado o filme a partir do desemprego, e do que é que é estar quase a sair da faculdade da mesma forma que as crianças deixam a primária, e o futuro ser apenas uma grande incógnita como o último plano do cesto de basquetebol.

Relativamente aos prémios, não sei se diria que me deram um gozo especial, apenas que fiquei muito contente por existir um contexto em que tenha sido possível o filme ser reconhecido.

De onde surgiu a ideia para Primária? Qual a razão de teres escolhido uma turma do 4º ano para a curta?

Eu sabia que tinha de fazer um documentário no próximo semestre, por isso fui pensando durante as férias num universo onde me interessasse estar presente durante algum tempo. E quando me lembrei da escola primária, pareceu-me logo uma boa direcção a tomar, porque se havia lugar ao qual eu gostava de regressar era esse.

A turma de quarto ano é qualquer coisa que vem logo agarrado à ideia da primária, não foi uma opção que tenhamos tomado depois. Isto é, a ideia sobre a primária era justamente essa: como é que se deixa aquilo que conhecemos e vamos em direção aquilo que desconhecemos. Como é que estas crianças lidam ao mesmo tempo com uma alegria muito particular (do recreio) que está quase a terminar e uma exigência (dos exames) que é muito elucidativa do mundo que vem a seguir.

Se não fosse o teu filme a ganhar, qual era o teu favorito? Porquê?

Não vi a sessão de sexta-feira, mas, relativamente a sábado, o filme que mais gostei foi o Rei Inútil, simplesmente porque me pareceu capaz de dizer o que tinha a dizer. Agora que penso sobre isso, diria que o Primária até acaba por ter algum ponto de contacto com ele. Mas fiquei logo fascinado com o início, acho que é assim que se começa um filme, ou pelo menos uma curta-metragem – ainda estamos na primeira cena e já sabemos qual é o conflito. E depois fico sempre deslumbrado com os diálogos dos filmes que vi do Som e a Fúria. São os únicos diálogos que até hoje fui capaz de levar verdadeiramente a sério nos filmes portugueses, de aceitar sem qualquer desconforto.

Como vês o panorama atual do cinema em Portugal? Sentes-te apoiado, enquanto jovem realizador, a continuar?

Naturalmente sinto-me desamparado, sinto-me como no Primária. Mas penso que isso não tenha a ver com o universo do cinema, mas com a situação geral de qualquer pessoa que esteja a terminar a faculdade. Gostava muito de trabalhar no cinema e de poder continuar a fazer os meus próprios filmes fora da escola. Mas ainda falta um ano para terminar. Logo nos havemos de fazer à vida.

Tens algum projecto futuro?

Sim, neste momento estamos a desenvolver a curta-metragem para este semestre.

O que achaste do Córtex? Enquanto festival, qual é a opinião que tens dele?

Achei eficaz e muito competente. Só tenho pena que não tenha havido mais adesão do público, mas penso que isso tem apenas a ver com a disponibilidade de ir até Sintra. E teria gostado também que houvesse mais oportunidades de discussão, acho que essa possibilidade é um dos aspetos mais valiosos dos festivais, e que os pode distinguir positivamente do circuito das salas de cinema.

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