Sábado, 27 Abril

Entrevista a David Ayer, realizador do explosivo «End of Watch» (Fim de Turno)

“Encontrei a minha voz enquanto realizador”

 
Fim de Turno é um valente murro no estômago. Esqueçam tudo o que já viram sobre policias em LA. David Ayer, talvez um dos mais experientes nessa área, introduz-nos literalmente num carro da polícia e leva-nos a passear pelas zonas mais “quentes” de South Central: guerras de gangues, violência doméstica, pequenos crimes – no fundo, o dia-a-dia de uma dupla de agentes da LAPD. Em muito contribui o estilo vibrante da câmara subjetiva – aparentemente, segundo nos revela, muitos agentes gostam de filmar e de se filmar -, tal qual um shooter na primeira pessoa. É claro que Jake Gyllenhaal tem um papelão, juntamente com Michael Peña, mas é Ayer quem capta este estilo vibrante. Como um tiro certeiro. Boom!

À conversa com DAVID AYER na estreia mundial no festival de Toronto

É um filme fortíssimo. Ficou satisfeito com a reação do público?

Sim, tivemos a estreia mundial aqui em Toronto e tivemos uma ovação de pé. Para mim, é uma estreia. Acho que o filme foi melhor recebido do que esperava.

Porque escolheu este estilo que às vezes se torna mesmo arrepiante?

A razão pela qual escolhi este estilo é porque tenho um amigo na polícia. E tanto ele como os colegas levam câmaras para o trabalho e filmam-se a eles e aquilo que vêem. Algumas coisas que vi são mesmo incríveis. Nunca vi nada assim. Ora essa foi uma técnica que decidi trazer para o filme. 

No fundo, algo que é muito comum nos dias de hoje…

Hoje em dia todos somos realizadores, o iPhone está em todo o lado. Todos se filmam a si próprios: os bons e os maus. Todos filmaram e viram os resultados. Nesse sentido, a forma como o nosso cérebro processa a realidade é bem diferente. Quase seguindo um estilo youtube. É claro que com isto quebrei uma série de regras de cinema e fotografia com este estilo e com a montagem. Mas também usei o estilo mais convencional, pois não me queria limitar.

E porque decidiu usar muitas cenas em câmara subjetiva e não um diretor de fotografia?

Desde logo porque não acredito em regras e não quero que uma percepção genérica me vá dizer como devo contar a minha história de uma forma mais correta. Não quis prescindir de nenhuma ferramenta. O estilo POV (point of view shot, ou câmara subjetiva) é bom para definir o ponto de vista da personagem e a ação. Mas passado algum tempo torna-se aborrecido. Por isso decidi mudar para o modo convencional. Sobretudo os momentos mais emotivos. Acho que servia melhor o filme.
 
 
 
Já agora, como foi concebida a história?

Um amigo meu, que passou muitos anos no LAPD e viveu situações com gangues. Muitas da situações neste filme aconteceram com ele. Depois de ter feito alguns filmes com polícias corruptos, queria fazer algo diferente. Ou seja, fazer algo com agentes corretos. Queria mostrar como é o verdadeiro polícia de LA. 

Até que ponto a sua experiência o transformou neste tipo de cineasta dedicado a descrever esta realidade urbana de South Central? Diria que era algo inevitável?

É inevitável. Porque é o mundo em que cresci e compreendo. Percebo como os polícias pensam, conheço bem a organização, a tética e o estilo de vida. Para mim, é fácil fazer um filme policial, porque sei o que é. 

Acha que este filme se destaca dos que já fez?

Sim. Acho que consegui fazer o que queria. Depois de todos estes anos, penso que encontrei a minha voz enquanto realizador. Acho que agora posso trabalhar de uma forma diferente. 

Mas como é chegar assim tão perto dos gangues? Não é fácil.

Eu cresci junto destes tipos. Sinto-me confortável em lidar com eles. Sei como falar com eles.

E eles estão abertos a falar consigo? A partilhar experiências?

Sem dúvida. Usamos alguns ex-membros de gangues no filme. E até alguns que ainda o são. Mas devido à minha história pessoal e pelos filmes que fiz, estes tipos são bastante abertos comigo. Nunca tive problemas com eles. Nem com os gangsters bem com os polícias.
 
  

Quando escreveu o guião tinha algum nome na memória para os papéis principais?

Normalmente, isso nunca sucede. Nunca trabalho com nomes pré-definidos. Deixo as personagens crescer e afirmarem-se. É só depois que imagino que possa ser. Quando o Jake leu o guião, quis muito fazer o filme.

Fez um casting com ele?

Sim, ele fez testes. E estava disposto a fazer qualquer coisa. Foi essa determinação de fazer qualquer coisa que me fez escolhe-lo. Aliás, a audição foi apenas uma formalidade. Só queria saber se ele estava também preparado para enfrentar os cinco meses de um treino brutal. 

E o Michael Peña?

O Michael não fez audição. Tinha uma aproximação diferente ao papel. Seria um polícia experiente. Ele tem uma coisa boa, em cada papel ele transforma-se completamente. Por isso, ninguém conhece o Michael Peña. Eles conseguem uma química incrível.

Acha que com este filme, o tema policial fica coberto, ou no seu próximo projeto (Ten) será diferente?

Sim, Ten será um filme com o Arnold Schwarzenegger e o Sam Worthington, e começo a rodar em Outubro. É um filme sobre o DEA (Drug Enforcement Administration). Sobre a guerra da droga, o DEA tem um papel diferente. Decorre em Atlanta, na Geórgia. É um mundo diferente, mas é ainda sobre a polícia.

O estilo será diferente deste filme?

Será ligeiramente diferente de Fim de Turno. 

Acha que tentará outros géneros?

Sim, quero fazer um filme sobre a 2ª Guerra Mundial, quero fazer um filme de ficção científica. Sim, há outros géneros que quero experimentar.

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