Quinta-feira, 25 Abril

Entrevista a Teresa Villaverde, realizadora de «Cisne»

 
Aproximadamente há uma semana atrás (no dia 8 de Setembro), e logo após a sua estreia no Festival de Veneza (no dia 6), chegou às salas portuguesas «Cisne», o novo filme de Teresa Villaverde («A Idade Maior», «Os Mutantes»,«Transe»).
Seleccionado para a secção Horizontes da Biennale, em «Cisne» seguimos Vera (Beatriz Batarda), uma cantora de pouco mais de 30 anos  apaixonada por um músico que só consegue amar à distância. Pablo (Miguel Nunes), um rapaz solitário, foi quem ela escolheu para motorista e companhia nas suas intermináveis noites de insónia. Certo dia, Alce (Sérgio Fernandes), um miúdo pobre conhecido de Pablo, mata acidentalmente uma pessoa. Vera envolve-se então com a criança e ao ajudá-la, ajuda-se a si própria.
Com Beatriz Batarda, Miguel Nunes, Israel Pimenta, Sérgio Fernandes, Rita Loureiro, Marcello Urgeghe, Tânia Paiva e Carlos Guímaro no elenco e com uma banda-sonora com nomes como Chico Buarque, Caetano Veloso, Dorival Caymmi e John Cage, «Cisne» marca o regresso ao grande ecrã de um dos maiores nomes do cinema português.
O c7nema teve a oportunidade de falar com Teresa Villaverde, que nos contou um pouco mais sobre a sua carreira e sobre o seu novo filme. Aqui ficam as suas palavras:
 
 
Teresa Villaverde
 
 «Eu escrevinho muito, muitas notas, até perceber que estou a escrever um filme»
 
 

Vinte anos depois de «A Idade Maior» o que mudou na Teresa Villaverde enquanto cineasta e autora e no próprio cinema português?
 
Mudou tanta coisa, nem sei por onde começar. Quando recebi o primeiro apoio para o meu primeiro filme, tinha 22 anos. Naquela altura era estranho um realizador/a tão novo, tanto em Portugal como fora. Hoje é mais normal e felizmente porque é uma idade em que as pessoas são particularmente criativas e ainda sem auto-censura. Foi, para mim, um privilégio. Naquela altura, início dos anos 90, havia uma grande curiosidade pelos novos cineastas que surgiam. Essa curiosidade começou fora de Portugal, mas depois estendeu-se ao país também.
 
Neste momento está tudo mais difícil. Temos feito tudo para levar o público ao Cisne, e estamos muito aquém ainda do nosso desejo.  O desinteresse pelas salas de cinema é geral, os DVDs, a internet, têm roubado muita gente às salas. Mas temos que continuar a tentar porque não há nada que se compare à beleza do mistério da sala escura. 
De onde surgiu a ideia para «Cisne»? Qual a génese do projecto?
 
Eu penso que uma pessoa que trabalhe como eu, com o cinema cara a cara com a poesia, não pode saber exactamente qual a primeira imagem ou a primeira vontade. Eu escrevinho muito, muitas notas, até perceber que estou a escrever um filme. Escrevo muitas frases soltas antes de saber quem está a falar, e de repente sei quem fala e sei de quem estou a falar. É assim. 
Como foi financiada a obra? Li que teve de criar a sua própria produtora? Como correu a experiência?
 
Este filme teve só dinheiro português, é o primeiro que faço assim. Claro que era por isso pouco dinheiro. Tivemos o apoio do ICA, da Fundação Gulbenkian e da Câmara Municipal de Lisboa.
 
Por ser pouco dinheiro, pareceu-me importante poder controlar cêntimo a cêntimo onde era gasto, e foi por isso que quis produzir eu.
 
Foi possível e correu bem porque em Portugal há técnicos excelentes, que são excelentes em qualquer parte do mundo. Tive uma equipa dessas, todos excelentes e muito solidários. Enquanto filmei, fui só realizadora. Foi uma experiência muito boa.
 
E os actores. É a primeira vez que trabalha com a Beatriz Batarda. Como foi essa experiência? É para repetir?

Cada filme que fazemos nos pede coisas diferentes. Este filme pediu-me a Beatriz e foi um encontro muito feliz. Penso que o nosso entendimento, neste filme, foi quase perfeito. Penso que seria muito estranho se não voltássemos a trabalhar juntas, vejo isso como um cenário sem sentido. 
 
 
 
Beatriz Batarda no filme «Cisne»
 
O foco central  dos seus filmes são quase sempre mulheres. Existe alguma razão específica para isso? São as mulheres e as suas histórias mais interessantes de filmar?
 
Penso que é assim por eu ser mulher também. Talvez um dia venha a escrever tendo um homem como centro, mas ainda não aconteceu. Acho que percebo muito melhor as mulheres do que percebo os homens. Mas é uma lacuna minha.  
 
Um dos seus maiores desejos é encenar uma peça de teatro. Porém, faz-lhe alguma confusão não estar colada aos actores? É uma realizadora «sempre em cima dos actores» ou dá-lhes bastante espaço de manobra para improvisarem?
 
Penso que se pode ganhar muito em dar-lhes espaço, mas não sei dar espaço sem estar colada. Acho que faço as duas coisas em simultâneo. No momento em que a câmara trabalha, é bom se tivermos um só coração. Quando acontece é muito bom. Bom para o trabalho e bom para a vida. 
Já é uma repetente em Veneza. Como foi a recepção ao filme e mais uma presença no Festival?
Foi bom estar em Veneza mais uma vez, ainda estou a receber ecos e penso que o filme vai viajar bem. Estou muito contente com o filme, mas tenho na noção de que o meu cinema se afasta do que hoje é mainstream, mas as correntes mudam e nós temos que nos manter fiéis àquilo em que acreditamos.
 
Sei da dificuldade dos tempos, mas os tempos seriam mais difíceis se não houvesse a arte e os artistas. Em tempos de crise de tudo, é mesmo importante ser-se artista sério. Tento ser isso.
 
O ICA escolheu «José e Pilar» para concorrer à nomeação ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. Viu o filme? Gostou?  O que achou dessa nomeação e que hipóteses acha que temos? 
Não sei que filmes estavam na condição de ser escolhidos, e seguramente não os vi todos. Vi o filme do Miguel Gonçalves Mendes e gostei. Penso que o José Saramago e a Pilar del Rio são duas pessoas com muito a dizer e o filme do Miguel mostra bem isso.

Penso que para se ter uma hipótese ainda que remota, o filme tem que ter estreado nem que seja uma semana nos EUA, penso que é o caso do “José e Pilar”, e caso não seja, acho que não terão nenhuma dificuldade em fazer isso.
Desejo sorte e muito trabalho de bastidores. 
 
O Governo diz que está a preparar uma nova legislação para o cinema em Portugal. Apoia a medida que diz que se deve olhar para o número de  espectadores quando se atribui subsídios no cinema?
 
Vejo isso como uma medida muito perigosa. Volto a dizer, em tempos de crise, crise de tudo, financeira, de desnorte das pessoas, a arte é uma pedra fundamental. A arte remete-nos para o nosso centro. O estado tem é que apoiar mais a promoção dos filmes para que todos tenhamos mais público. Não é preciso dinheiro para isso, o estado tem muitas formas de ajudar.
Para além da ideia de se estrear no teatro, tem ainda algum projecto em mente ou de sonho que queira realizar?
Oh, mil coisas…
 
http://www.youtube.com/watch?v=NS-gmpRUw5Y 
 
 
 
Entrevista conduzida por Jorge Pereira 

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