Estamos em 2018 com uma nova geração, mas devemos partir para 1976 num tempo em que nos deparamos uma Filadélfia decadente, negligenciada e mergulhada em toda uma violência social.

Aí surgiu Rocky Balboa, pugilista de quinta categoria sem classe nem elegância no combate desportivo. Para alguns existe nele potencial, porém, fica-se pelas promessas porque vindo de um circuito pobre como esse, juntamente com a sua falta de ambição, longe nem sequer é considerado objetivo. Balboa é um verdadeiro underdog, até então passivo no seu próprio ambiente. Nesse mesmo ano, outro pugilista surge em frente aos nossos olhos, Apollo Creed, ele é o campeão por direito e, como tal, os desafios tornaram-se escassos. Como forma de marketing (visto que o boxe é um desporto cada vez mais em função disso), os publicistas decidem organizar um combate ao acaso, procurando fora da sua categoria, escolhendo, da mesma forma, um lutador da divisão abaixo.

O resultado caiu na escolha de Rocky. A história, toda a gente conhece, ou pensa conhecer, é bem diferente do que realmente aconteceu. Efeito Mandela? É. Rocky não venceu o combate com Apollo, o filme apenas celebrou a sua oportunidade, nada mais que isso, resultando num hino ao orgulho, acima das vitórias materializadas, o que foi redimindo nas sequelas que seguiram. Mas voltando a 1976, o público torcia pela personagem de Sylvester Stallone depositando nela um estandarte de luta entre classes, a resistência perante elites e a busca pelo “sonho americano”, traduzido nas origens nunca ocultadas por Rocky, ou The Italian Stallion.

Assim chegamos a 1985, com um quarto filme instalado no seu próprio contexto temporal, a Guerra Fria, obviamente cedendo a maniqueísmos evidentes. O conflito entre duas nações emprestado no combate corpo-a-corpo entre dois pugilistas, de um lado o “americano” Rocky sob as promessas de vingança (Apollo Creed foi morto no ringue pelo seu adversário) e do outro o orgulho soviético Ivan Drago (interpretado por Dolph Lungdren). À partida, esta sequela musculada e esteticamente vibrante serve de apoio para esta continuação do bem-sucedido spin-off onde Creed, filho do falecido Apollo, atesta-se como um campeão mundial, contando com o agora reformado Rocky no canto do ringue. E é então que o passado persegue. Iva Drago regressa, apresentando o seu filho (o lutador Florian Munteanu), constantemente treinado como um cão de guerra, para uma luta a favor da estima perdida.

Mesmo retornando aos ecos da Guerra Fria, que por sua vez nunca abandonaram Hollywood, Creed 2 apresenta-se como um determinando jogo de legados tendo como o boxe a mais romantizada das suas catarses. Mas algo falha aqui, e não mencionamos a falta que Ryan Coogler faz na direção, um realizador sobretudo tecnicista que atribuiu no filme de 2016 um brilho que se poderia ter esgotado na pré-produção (o substituto Steven Caple Jr. Falha na narração, mas solidifica a espetacularidade), até porque recuperar Stallone e a sua mais querida personagem após a melancólica despedida de 2006 (poemas másculos e triviais convertidos a um soneto motivacional) torna-se num gesto ingrato e oportunista. Enfim, o que aconteceu com os novos desafios de Creed é que não nos deparamos com o velhinho reconto da ascensão. A personagem de Michael B. Jordan (possivelmente um dos carismáticos atores da atualidade) encontra-se no topo, favorecido, frente a um nemesis criado com só objetivo, vindo de um ambiente que Rocky tão bem partilha em 1976. A juntar a esta equação, a relação frívola com o pai (porta aberta para epifanias de paternidade).

Com isto, vai-se desencadear o seguinte: o espectador apercebe-se que Creed 2 embica numa jogada de patriotismos escondidos com teorias “batidas” da conspiração embutidas, ao invés de manobrar as emoções impostas no primeiro round. Resultado, caímos no desnecessário para todo um legado, com Sylvester Stallone a servir de gancho para ambos os franchises, e um filme corriqueiro para com a sua receita de eleição. É sim, uma história de ascensão … ou será antes de (re)ascensão, prometendo às audiências um reencontro entre gigantes (a primeira partilha de ecrã entre Dolph Lungdren e Stallone está ao nível das conversas de café entre DeNiro e Pacino em Heat, de Michael Mann), uma desconstrução do estigma yankee a russos (reprovado) e toda uma teia de relações quebradas e restauradas (o foco devia estar apontado ao inimigo ao invés do protagonista sem nada a perder).

Mas no fim, é isso mesmo: promessas, jabs e uppercuts. Um campeão insuflado