Sexta-feira, 19 Abril

«Lizzie» (A Vingança de Lizzie Borden) por Jorge Pereira

Lizzie Borden had an axe. 
She gave her mother 40 whacks. 
When she saw what she had done. 
She gave her father 41. 

Há anos que Chloe Sevigny ambicionava interpretar o papel de Lizzie Andrew Borden – uma das figuras mais tradicionais e icónicas da cultura popular norte-americana – que foi levada a tribunal no final do século XIX pelo duplo homicídio do seu pai, Andrew J. Borden, e da sua madrasta, Abby Borden, mortos na sua casa com recurso a uma arma pesada e afiada no dia 4 de agosto de 1892.

A atriz – que sempre se destacou pela presença em obras polémicas (de Kids a Brown Bunny) e chegou a estar ligada a um projeto de TV que nunca avançou – entrega se de corpo e alma à figura mítica, mas é estranhamente mal secundada por Kristen Stewart (onde anda a protagonista de Personal Shopper?), que no papel da empregada irlandesa da família Borden nunca convence inteiramente, nem consegue uma verdadeira química de transgressão com uma Sevigny em grande forma e muitos furos acima.

Sevigny é mesmo o melhor que o filme tem para oferecer, na sua frieza e ambiguidade (louca? doente? fria?), até porque a direção de Craig William Macneill, extremamente convencional na forma e técnica, revela-se profundamente desapaixonada, em particular pelas personagens, pela relação entre elas, e por todas as transgressões que as duas representavam na sua época. O que o realizador consegue assim é transformar a tensão e contravenção num caso de “época”, um fait-divers de heranças, e – ao estilo de Colette e Mary Shelley – uma pouco impetuosa abordagem feminista às questões, pressões e injustiças da época. Na verdade, os temas, factos e especulações sobre o caso são lançados, mas existe uma parca desconstrução e análise dos mesmos, quer na sua implementação no contexto social da era, quer na sua trasladação ou ligação aos tempos atuais.

O resultado é assim um filme amorfo, uma tentativa de thriller psicológico sem psicanálise, um trabalho de questões e respostas simples, dispersas, tímidas, salvando-se a apresentação do crime em si, onde uma enorme carnalidade se funde com o calculismo glaciar da nossa Lizzie.


Jorge Pereira

 

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