Sexta-feira, 19 Abril

«Bel Canto» por André Gonçalves

O estilo operático que dá nome a este título do sempre difícil de categorizar Paul Weitz (American Pie, About a Boy) faz logo esperar um drama apaixonante, e também ele operático, mas Bel Canto acaba por se revelar um mero filme político de mensagem explícita, mensagem esta capaz de figurar num pacote de açúcar. A saber: a música, neste caso o canto lírico, é a grande linguagem universal capaz de unir povos de várias origens e ultimamente salvar o mundo do caos que nos encontramos. O caos aqui presente é um conflito político, que obriga forças rebeldes a fazer reféns de um evento, entre os quais a cantora de ópera mundialmente reconhecida Roxanne Coss e seus fãs de diversas nacionalidades. Ouvimos espanhol, japonês, francês, alemão… como se a maldição de Babel estivesse toda aqui focada numa sala.

Assim, entre a tentativa de alheamento da realidade através do visionamento da novela Maria la del Barrio (a ação decorre no final da década de 90), a violência sempre latente e uma vontade de aprender outras línguas, começa a nascer o amor. Não só entre um, mas dois casais. Nada como uma situação de reféns para disparar o romance entre estes, afinal.  

Sendo a música o verdadeiro motor desta narrativa, existe logo uma questão problemática à cabeça: nada contra o playback, quando bem executado. No caso de Julianne Moore, geralmente uma atriz capaz de elevar sempre o material que lhe é proposto, foi-lhe dado um presente envenenado aqui. Não se esperava que fosse cantar como uma cantora de ópera, não senhor, mas o seu jogo de lábios com a voz da Renée Fleming denuncia o truque, removendo-nos assim do filme em alturas tão cruciais (talvez problema da realização e montagem também aqui). 

Bel Canto consegue ser a pior das obras do seu género dito “humanista”- nem subtil nas suas intenções, nem substantivo ou minimamente memorável na sua pseudo-essência cinematográfica (não falta sequer o slow motion entre música de violino a “embelezar” o final), no que usa para chegar ao seu objetivo. Uma espécie de resposta nas mesmas notas de Weitz ao cinema liberal de pacotilha de Sean Penn. 

André Gonçalves

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