A união entre Stéphane Brizé e Vincent Lindon não é novidade alguma, porém, é a constituição deste En Guerre … não a dupla … mas o próprio conceito de união. O ator é novamente um dispositivo narrativo nas mãos do realizador, que após a catarse da condição do (des)empregado e do mercado de trabalho que fora La Loi du Marché, converte-se num símbolo a uma luta sindicalista.

É uma guerra vivida no centro da modernidade, fora dos territórios bélicos que surgem em meio de um senso comum. Aqui as armas são outras, a determinação é a munição do seu infante e a negociação a artilharia pesada. Lindon é assumidamente um capataz, um general de forças humanas que se condensa como uma massa coletiva, uma multidão que resume-se em si na personagem fatal. Obviamente que Brizé regressa ao seu registo de quotidiano, a realidade encenada que tão bem emprega, mas convém salientar que En Guerre existe uma vergência, um afastamento dessa mesma restrição.

Em toda a sua narrativa, a batalha “campal” de Lindon é despojada de qualquer dramaturgia sobrejacente, tudo aqui é imposto e exposto como a graça de mimetizar o real em confundir atores com os não-atores, e através desse sistema ancorar numa certa pedagogia de à lá Laurent Cantet. Mas a continuidade da ação é abruptamente intercalada por outra encenação, um falso mídia que em modo flash news garante-nos como outro dispositivo narrativo, forjando assim a rápida sucessão dos acontecimentos. Sabendo, fora dos termos práticos de tais veículos narrativos, estas escolhas de Brizé endereçam-se como uma representação do chamado “Quarto Poder”, o papel de moderação que a imprensa possui.

Toda esta construção e distopia entre as frentes sindicalistas, as lutas dos trabalhadores em desespero, com esse registo dentro de um registo por parte de uma fictícia imprensa, colidem para nos entregar um filme politizado no gesto; para os mais infamados será “esquerda” a definição a utilizar. Portanto, há ferramentas de ativismo neste En Guerre, evidenciando a jornada de Brizé perante as diferentes bifurcações do mercado de trabalho, como se tudo se reduzisse a uma passagens de etapas cíclicas.

Agora, repescado a essência do termo coletivo, é de valorizar o cinema francês como o grande herdeiro das representações pluralizadas de Sergei M. Eisenstein (assim por alto recordo do muito esquecido La Bataille de Solférino, de Justine Triet). En Guerre é essa resistência pela diluição do individuo e a criação de um “monstro” pluriforme e quimérico – quando as massas humanas se tornam elas próprias na personagem.

Só é pena que Brizé se traia a si próprio, cedendo ainda mais pelo simbolismo da sua luta e do ator-fetiche, como se pode observar num final desesperante e personalizado para com os demais. Contudo, esta é das obras mais impactantes da sua filmografia recente.

(texto originalmente escrito em 16 de maio de 2018)