Sexta-feira, 19 Abril

«L’apparition» (A Aparição) por Jorge Pereira

Três anos após Marguerite, um sucesso entre a crítica e o público (4 Césares e mais de um milhão de espectadores), Xavier Giannoli regressa com A Aparição, filme encabeçado por Vincent Lindon no papel de um repórter de guerra que é convidado pelo Vaticano para fazer parte de uma comissão com uma tarefa especial: integrar uma comissão que pretende apurar a autenticidade de uma alegada aparição da Virgem Maria numa pequena vila francesa.

As promessas e mentiras são um tema recorrente da cinematografia de Gianolli, cineasta corso que em vez de preferir avaliar a impostura e “os impostores” foca-se no impacto que eles têm nos outros, a “fé” que estas pessoas depositam neles, tudo através de uma visão íntima, necessariamente não resultante de um ato maldoso ou consciente de um verdadeiro vilão, mas condicionador da vida dos demais.

Neste caso, e apesar de Lindon roubar os holofotes no centro da investigação, a jovem Anna é o grande palco emocional de toda a história, carregando consigo o “fardo” da verdadeira prova de fé numa vila invadida por peregrinos e turismo religioso, lançando igualmente um olhar à adolescência e ao seu novo papel central de “auto-sacrifício” em prol de algo “maior” (poderia ser a história de Bernardette de Lourdes).

Ora, esse invisível e não palpável, é o que Lindon tenta apurar, atingir ou desmitificar. Habituado e crente apenas nos factos, o ator e o seu Jacques embarca numa viagem em busca da verdade, não de uma forma cínica, maldosa, gozona, mas certamente cética e ponderada na sua crença jornalística e científica.

Gianolli constrói todo o seu inquérito canónico na forma de um thriller policial sem devaneios de intriga religiosa espalhafatosa ao estilo Código Da Vinci, mas antes com um grande sentido de realidade e reserva, uma investigação profunda do tema e da vida das personagens envolvidas, sempre mescladas e apresentadas de uma forma cinematograficamente elegante, onde a fotografia de Eric Gautier, a mistura de som de François Musy (habitué dos filmes de Godard) e a música de Arvo Parth dimensionam o filme entre o plano mundano e místico, deixando nas entrelinhas uma suave transição entre a vida terrena e a espiritual.

Palmas igualmente para o duo de atores principal, com Lindon a, como é seu hábito, entregar uma performance convincente e repleta de ambiguidades e dúvidas – sem nunca perder o foco – e Galetea a contribuir com uma profunda sinceridade na forma como se torna prisioneira daqueles que querem espalhar a sua palavra e imagem. É o encontro com Jacques que “vai atrapalhar o seu silêncio” e desencadear uma reaprendizagem da sua condição humana, agora entre o “estrelato” ou arquétipo religioso e a mera adolescente, que o é.


Jorge Pereira

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