Sexta-feira, 19 Abril

«Winchester» (A Maldição da Casa Winchester) por Hugo Gomes

A Mansão Winchester é uma das construções arquitetónicas mais extravagantes e incomuns dos EUA. Construído pela viúva Sarah Lockwood Winchester, aliás, reformulando … em plena construção durante 38 até à sua morte (de 1884 a 1922), a mansão e a sua estrutura bizarra, como reza a lenda, serviria como uma espécie de prisão a todas as almas vitimizadas pela criação da espingarda Winchester, o amaldiçoado negócio de família que dita um legado de violência no país.

Obviamente que um filme sobre o dito imóvel e esta bizarra historieta de aparições, maldições e assombrações teria todo o gosto em fazer as delicias das audiências, dando asas à imaginação e criatividade por parte dos irmãos Spierig (Daybreakers, Predestination). Mas desde Jigsaw que a dupla promissora do cinema de género parece confundir-se com o estado desta industria cada vez mais condescendente, até porque este Winchester é uma verdadeira “bala de pólvora seca”.

Em causa está, antes de mais, o desaproveitamento da atmosfera que suscitaria nesta dita mansão Winchester. Ao leitor, de forma a verificar o declarado, basta visualizar um quantos vídeos ou visitas guiadas ao mesmo espaço para perceber a invulgaridade da casa e o seu ambiente. Mas este fracasso cénico é o menos neste balanço das milésimas regras feita a régua e esquadro que compõe muito do atual cinema terror. É certo que espíritos e assombrações estão em voga, em paralelo com a ascensão do cinema-escola da Blumhouse e sequencialmente de nomes como James Wan ou David F. Sandberg em fazer a festa.

Contudo, Winchester preserva essas linhas-guias jogadas a uma tendência de rascunho mal emparado. Para os Spierig executar um filme da mais fascinante mansão norte-americana, bastou juntar os seguintes ingredientes:

1)Se trata de um filme sobre mansões e espectros, temos que ter uma desculpa de psicologia, neste caso basta uma personagem inserida no ramo para servir de infiltrado no ambiente que nos espera. Relembro doutros casos, mais memoráveis, deste tipo de Cinema para refrescar a mente do leitor; o ensaio psicológico a ser experimentado em The Haunting (1963) ou até mesmo o grupo de parapsicólogos em The Legend of the Hell House (1973) de forma a “estudar” qualquer entidade maligna.

2)Se vamos ter fantasmas, as crianças são um bom catalisador dos eventuais sustos. São cobaias que distorcem a nossa ideia de inocência anteriormente alicerçadas à sua imagem, substituindo-a por velcros de calafrios, ou assim se tenta. Como anexo, juntar uma melodia, canção infantil ou tradicional para enfatizar o propósito.

3)Objetos ou “macguffins” usuais para os nosso “jump scares”; cadeiras balouçantes, compartimentos proibidos com antecedência, espelhos e não esquecer de escadas, muitas escadas.

4)Existe um ritmo a ser respeitado, os jump scares ao serviço da rompante sonoplastia (aliás o verdadeiro susto reside no próprio som e não na imagem pop-up) devem ser inicialmente cuidadosamente cultivados ao longo da narrativa (apesar deste Winchester desleixar-se nessa norma), caso não houver mais astúcia nem imaginação para o implante desses mesmos dispositivos parte-se para o estapafúrdio “tudo ou nada” do terceiro ato (relembrar o leitor que até mesmo o The Conjuring 2 sofria de tais sintomas).

5)De forma a não sermos acusados de frieza, juntar a isto tudo uma moral, redenção ou profecia que possa ser utilizado como desfecho, o nosso Deus Ex Machina de pré-aviso.

Com estes cinco pontos funcionais constrói-se um filme de terror sob as matrizes da indústria mainstream. Winchester é isto mesmo aplicado mas sem a presunção de quem confiantemente ousa prevalecer. Pois bem, cansativo e desperdiçado registo que fere ainda mais quando apercebemos que Helen Mirren apenas foi contratada porque se assemelhava à verdadeira viúva. Dói mesmo, no fim de contas, ver uma atriz deste calibre a subjugar-se desta maneira. De mau gosto!

Hugo Gomes

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