Quinta-feira, 28 Março

«Lady Bird» por André Gonçalves

Lady bird, lady bird fly away home, Your house is on fire and your children are gone (Joaninha, Joaninha voa até casa, a tua casa está em chamas e os teus filhos foram-se embora) 

Terá sido inspirada nesta canção de embalar infantil que a atriz Greta Gerwig, na sua primeira estreia a solo como realizadora e argumentista, terá desenhado a alcunha que dá titulo a este filme – Lady Bird (joaninha) – a alcunha pela qual a personagem pede a todos que seja tratada, num gesto de afirmação não tão estranho para quem está a terminar o liceu e a sua adolescência, e enfrenta agora um mundo de infinitas possibilidades – ou assim ela pensa. 

Christine “Lady Bird” McPherson (Saoirse Ronan, sempre aquele nome mais fácil de escrever que pronunciar corretamente) tem no entanto um aparente obstáculo à sua tão almejada independência: a figura maternal (Laurie Metcalf), uma enfermeira que sacrificou horas de trabalho para construir um local para a sua família, e que vê agora esse sacrifício ser posto em causa, como se não tivesse sido tudo o que conseguiu. Como se houvesse uma negligência pelo caminho, como se por um golpe de mágica que a pudesse pôr no círculo dos miúdos ricos e populares. 

Gerwig, partindo em parte de experiências pessoais (vivência num colégio católico, paixão pelas artes… ) – embora tenha insistido que este não é um percurso autobiográfico  – desenha assim um núcleo emocional muito centrado numa relação entre mãe e filha. É aqui que o filme verdadeiramente se destaca, muito porque Gerwig se revela em primeiríssimo lugar uma boa diretora de atores. Ronan e Metcalf são uma equipa improvável de uma eficácia inegável, e são ajudadas por personagens minimamente aprofundadas, se ainda assim apoiadas em estereótipos de um percurso indie centrado em inúmeras dramédias de passagem de idade. Ainda assim, nota-se uma  diferença no cuidado em adicionar pelo menos um par de camadas, face a um outro título recente de relação mãe-filha como I, Tonya 

Mais evidente é a falta de maturidade na realização; segura, sim, mas nada memorável. Uma vivência fluída ainda assim, ajudada por uma montagem que tenta acima de tudo reduzir o filme ao essencial, chegando assim à hora e meia de película. Não cansa, pelo menos. Arriscaria no entanto a dizer que o subvisto Edge of Seventeen (por cá, sem qualquer atenção dos Oscars, foi direto para vídeo), do ano passado, era mais espevitado nesse aspeto. 

Na trilogia não anunciada de 2017 de filmes de passagem à idade adulta marcados por sangramentos do nariz completada por Call Me By Your Name e Thelma, Lady Bird é para mim facilmente o elo mais fraco; embora perceba pessoalmente que se queira apoiar uma pessoa tão claramente talentosa como Gerwig – até porque há um factor género sempre presente aqui. 

 

 

André Gonçalves

Notícias