Terça-feira, 19 Março

«12 jours» por Jorge Pereira

O prestigiado Raymond Depardon – responsável por Délits flagrants (vencedor do Cesar em 1997) e Profils paysans: La Vie moderne (prémio Louis Delluc em 2008) – visita neste seu 12 jours o Universo dos pacientes hospitalizados num centro de psiquiatria sem o seu consentimento e a forma como um juiz lida com as suas situações nos primeiros 12 dias obrigatórios por lei em que têm de ser revistos os seus casos.

A lente de Depardon e a música de Alexandre Desplat seguem assim a dinâmica do espaço – em planos  normalmente claustrofóbicos  que indicam o caráter de reclusão do local – e o diálogo entre os juízes e os pacientes, acompanhados pelos advogados, cada um deles com motivações muito fortes para quererem sair ou ficar no local.

Este é um trabalho duro, profundamente metódico, gélido nas cores, mas extremamente forte nas emoções de homens incapacitados de tomarem decisões por eles próprios ou de conseguirem viver em sociedade.

Nesta incapacidade de tomarem decisões, uma questão moral obviamente se levanta. Terão eles condições para aceitarem desnudar-se em palavras e mostrar as suas situações dramáticas ao público? Será moral, mesmo mudando os seus nomes e alguns detalhes, mostrar o rosto de pessoas que o tribunal entende não terem capacidade para tomarem as suas próprias decisões?

A pergunta também já se fez em dois trabalhos portugueses, Pára-me de Repente o PensamentoTalvez Deserto Talvez Universo, mas aqui ganha nova pertinência pela forma como tudo é contado ao espectador; situações que à partida deveriam ficar entre as 4 paredes médicas ou na barra dos “tribunais”.

Ainda assim, e se esquecermos a moral e ética deste trabalho, 12 jours é um retrato gritante da doença, bem desenvolvido, montado e executado por um Depardon que felizmente nunca cai no sensacionalismo, mesmo que alguns dos doentes tenham histórias que nos façam rir timidamente, como um que diz que vai criar um partido político cuja primeira decisão será acabar com os psiquiatras, ou outro que sarcasticamente agradece ao juiz a decisão de o manter no local, com a expressão: «muito obrigado pelo seu abuso de poder».


Jorge Pereira

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