Bem-vindos ao absurdismo de um crowd pleaser ligeiro que de forma satírica brinca com a globalização dos mercados.

Aglaé (India Hair) é uma jovem que trabalha numa fábrica de automóveis no laboratório de acidentes, testando a segurança dos veículos até ao ínfimo pormenor. A sua vida é tão interessante como a de um hamster numa roda, ela própria o diz, mas considera-se feliz com o emprego que tem. Tudo vai mudar quando os patrões decidem deslocalizar a produção para a Índia. As leis francesas e o contrato da empresa obrigam que a multinacional lhe ofereça a mesma posição na Índia, isto através de um novo contrato de trabalho, desenhado essencialmente para que qualquer pessoa o recuse. A questão é que Aglaé acha que este é o seu emprego de sonho e aceita as condições, até porque verdadeiramente não tem nada que a ligue ao sítio onde vive.

As peripécias começam logo aí, com o realizador em estreia Eric Gravel a rapidamente transformar o filme numa louca road-trip para a Índia de Aglaé com mais duas colegas, Julie Depardieu (Liette) e Yolande Moreau (Marcelle), cada uma delas com motivações muito particulares.

Passando pela Suíça, Alemanha, Polónia, Cazaquistão e China, o filme vai apresentando situações absurdas com um humor muito peculiar, sem nunca cair no filme cartão postal, mostrando a interação do nosso trio com as gentes locais e os seus costumes, mas não cedendo nunca a visões turísticas primárias ou clichés culturais para os ocidentais se rirem (talvez a forma como é retratada a negociação entre patrões e empregados seja o maior estereótipo).

E se o foco inicialmente é Aglaé (amontoam-se os close-ups quando Gravel torna-nos íntimos da personagem), aos poucos as luzes passam para o trio e a sua viagem (crescem os planos de conjunto, alguns deles picados), e só na reta final o cineasta começa a trabalhar com planos gerais para carimbar a obstinação e sentido de aventura de toda esta viagem.

Construindo e desenvolvendo com maior ou menor genica as personagens, todas elas consideradas um «acidente industrial» para o mercado, em Crash Test Aglaé o que mais atrai é a forma como Gravel trata a protagonista, a qual nunca é vista pelo espectador como uma verdadeira heroína (embora a imprensa a transforme nisso), mas sim, uma jovem que chega ao ponto de nos momentos finais recorrer a pequenos roubos para cumprir a sua missão, sentindo derradeiramente na pele (e nos dedos) as consequências dessa obstinação.

Pontuação Geral
Jorge Pereira
crash-test-aglae-por-jorge-pereiraCrash Test Aglaé o que mais atrai é a forma como Gravel trata a protagonista, a qual nunca é vista pelo espectador como uma verdadeira heroína