Terça-feira, 19 Março

«The Big Sick» (Amor de Improviso) por André Gonçalves

Hollywood bem gosta de vez em quando de criar “casos de sucesso” partindo de objetos cinematográficos completamente inofensivos e pouco memoráveis a longo prazo. Daqui a uns anos, “The Big Sick” será, na melhor das hipóteses, pergunta para queijinho no Trivial Pursuit, sobretudo se confirmar os primeiros prognósticos de termos aqui filme para Óscar (nem que seja uma nomeação isolada para a sempre consistente Holly Hunter). O que fica, um mês após um primeiro visionamento, já é suficientemente nebuloso para ter confiança na afirmação anterior.  

Partindo de um trilho percorrido na TV por comediantes como Aziz Ansari (Master of None), esta comédia explora igualmente as aventuras de um comediante, desta feita paquistanês, que se apaixona por uma norte-americana. Aventuras por sua vez inspiradas em factos reais do próprio ator e co-argumentista Kumail Nanjiani (com um passado mais ligado à TV, também). 

Primeiro grande problema: os pais cumprem ainda a tradição dos casamentos arranjados, tentando arranjar várias pretendentes, sempre com o mesmo método, as quais Kumail guarda as suas fotos numa caixa. Segundo grande problema, aquele que tenta assim conferir carga dramática ao filme: a sua namorada, descontente com a dificuldade de Kumail se emancipar da sua família, discute com ele, e fica da noite para o dia com uma infeção grave, num coma induzido pelos médicos. 

Terceiro problema, o do espectador que acha isto tudo completamente rotina, que pensa que o balanço entre comédia e drama não é tão bem gerido como querem fazer crer: como dizer mal de um filme tão bem intencionado, e claramente orientado para dar visibilidade a uma minoria? Como, por outras palavras, ousar ofender um filme tão inofensivo? 

Bem, convém começar por dizer que há gargalhadas aqui que funcionam, mesmo à custa de material óbvio sim (a associação ISIS ao Paquistão, etc.). Mas lá está, é esse tom óbvio e normalizante da narrativa que incomodará quem esperava mais confronto e menos produto de linha de montagem “indie”, que acaba até por relativizar (menorizar) os seus conflitos particulares (nomeadamente um coma a partir de uma doença grave desconhecida, e a temática dos casamentos arranjados).  

André Gonçalves

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