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«Gold» (Ouro) por Jorge Pereira

As histórias baseadas em burlões reais no mundo da economia e finança têm nos últimos anos ganhando protagonismo e enchido os ecrãs de cinema, normalmente em projetos trabalhados a pensar na época alta das premiações, com os Oscars como a batalha final. O Lobo de Wall Street ou A Queda de Wall Street são dois bons exemplares deste género de filmes, que bem podia contar com Gold (Ouro) para formar uma espécie de trilogia sobre “empreendedores” que se revelam verdadeiros canalhas e intrujões num mundo reinado pelo capitalismo selvagem que protege essencialmente a ganância e os abutres.

O problema é que Gold fica bem aquém das duas produções referidas, pisando continuamente em território já visitado e não construindo quase nada de novo para nos cativar com o que tem para nos dizer. E havia tanto para contar nesta adaptação do caso real da Bre-X, um escândalo que começou em 1995 quando o fundador da empresa, juntamente com um geólogo, resolveram impulsionar a sua empresa com a compra do que seria apelidado de “El Dorado” da floresta tropical de Bornéu (Indonésia), dizendo que por lá encontrava-se um gigantesco jazigo de ouro. As bolsas enlouqueceram, milhares de negócios foram feitos e quando se descobriu a verdade tudo foi por água abaixo, sendo a bolsa arrastada pela crise.

A liderar esta produção está Matthew ‘Alright, Alright, Alright’ McConaughey no papel do “perseverante” Kenny Wells (um novo nome para a cópia da pessoa real, David Walsh), empresário obcecado em ouro e com padrões de ética duvidosos que se envolve na tramóia. McConaughey começa por parecer uma evolução da sua própria personagem em O Lobo de Wall Street, e o filme é também arrastado para terrenos da obra de Scorsese. O texano agarra o “seu escravo” do sonho americano com unhas e dentes como Christian Bale o fez em Golpada Americana, de David O. Russell, transformando-se até fisicamente, mas caindo muitos vezes naquilo que normalmente definimos como overacting, sobrepondo-se à personagem e debitando tiques excêntricos ao minuto como que a capitalizar-se para os prémios do cinema.


Matthew McConaughey 

Mas onde Gold falha mesmo nem é nas personagens ou interpretações – mesmo com um Edgar Ramírez estranhamente contido e numa total ausência de quimica com McConaughey. A grande falha por aqui é a a falta de engenho de Stephen Gaghan (realizador) e Patrick Massett e John Zinman (argumentistas) em transpor para o papel uma história tão rica em enganos e trafulhices.

O primeiro e segundo ato são, acima de tudo, molengões e pouco interessantes, o que leva a que quando as descobertas começam a ser reveladas e surgem as conclusões com o FBI ao barulho já estejamos bem longe de estar interessados naquilo que a fita tem para nos dizer. Isso revela-se ainda mais fulcral quando o nosso protagonista apela aos nossos sentimentos, querendo o realizador deixar no ar uma certa ambiguidade se ele é efetivamente uma vitima de toda a situação ou alguém que se aproveita de uma fraude para proveito próprio. Mas por esta altura dos acontecimentos, essa dualidade já nem sequer importa pois já não nos interessa escavar mais para tentar encontrar ouro por aqui. Nem prata. Nem bronze….nada.

O melhor: A recriação da época
O pior: O primeiro ato devia nos agarrar e não afastar.


Jorge Pereira