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«The Party» (A Festa) por Paulo Portugal

Depois do brilhantismo “arthouse” de Orlando, já lá vão uns anitos, a produção de Sally Potter tornou-se algo intermitente. Em todo o caso, The Party recebeu aplauso na primeira sessão de imprensa aqui em Berlim. E foi, de resto, com essa indicação que fomos de peito aberto para os prometidos 71 minutos de cinema de circuito fechado, à procura dos diálogos dos vários convidados que celebram a promoção política da personagem de Kristin Scott Thomas. No entanto, logo percebemos que este registo em contrastada fotografia a preto e branco não era mais do que um “light crowd pleaser” sofisticado para entreter. De resto, foi enorme o aplauso do público na imponente sala do Friedrichstadt-Palast. Pena é que o humor seja bem mais de situação e a pedido do que pelo mérito do texto.

De resto, até a comparação feita ao mal-amado The Dinner, [1] de Oren Overman, exibido há dias no festival, acaba por funcionar ao contrário, já que a intensidade de panela de pressão, a qualidade do texto e mesmo a interpretação acaba por ser mais envolvente. Nada a dizer. De um lado, um filme simpático empenhado num reviralho de situações, do outro, a adaptação de Moverman de um trabalho mais eficaz de texto e atores. Enfim, são gostos.

Quando Kristin Scott-Thomas abre a porta da sua casa em Londres e aponta uma pistola ao espetador percebemos que essa ‘party’ não vai ser pacífica. De resto, um Timothy Spall esgotado, magríssimo e ausente procura esconder-se atrás dos blues que põe a tocar no pick up. Patricia Clarkson, talvez a compor a personagem mais sólida, é a sua colega de partido que usará da sua cortante ironia como uma arma de fogo; desde logo para o ‘marido’, um Bruno Ganz em versão karmica e espiritual, frequentemente chamado a por água na fervura neste micro-ondas emocional rapidamente à beira de um ataque de nervos. Há ainda o casal gay, com a jovem Emily Mortimer a declarar a sua esperança de trigémeos e a bem mais terrena Cherry Jones pouco preparada para esse inesperado futuro. Será Cillian Murphy a cereja no topo do bolo? Pelo menos, este consultor financeiro dependente de coca e com uma dúvida afetiva é claramente o elemento mais à deriva – a arma é dele. Marianne, a sua mulher, não virá, mas será também essa ausência o rastilho da bomba com sucessivas explosões.

Lá está, temos aqui material de sobra para uma festa de revelações e crises. De resto, a câmara de Alexey Rodionov até faz o que pode ao assumir-se como barómetro da pressão interior. De uma forma mais lateral teremos até um auscultar do ambiente político do país autor do Brexit, ainda que apenas a conferir mais um tom à história. Sejamos francos, é bem mais de entretenimento ligeiro que se trata quando se trata desta The Party. Talvez pudesse, e devesse, ser mais festa. 

Paulo Portugal