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«Les Innocentes» (Agnus Dei – As Inocentes) por Hugo Gomes

Este é o mais belo dos filmes de Anne Fontaine. Beleza essa, salientada pela fotografia de Caroline Champetier, que conjunta o brilho reluzente da neve caída com a escuridão opressiva resida nos obscuros compartimentos do convento onde esta ação decorre quase integralmente. Freiras violadas, deixadas à sua mercê com o fruto dessa agressão sexual no ventre, uma história passada nos ecos da Segunda Guerra Mundial, com o avanço soviético na Europa como percalço. 
 
Fontaine atribui neste drama histórico, nuances quanto à integridade feminina, passando por uma análise político-social de uma Polónia fustigada pela Guerra. Todo o ambiente de opressão, medo e ignorância vivido neste convento isolado, funciona como alusão dos medos interiores de uma Europa sob temor de eventuais “invasões“. Sob o retrato passado, Fontaine abrevia o futuro, assim como a posição da mulher, a sua vulnerabilidade perante um ambiente hostil. 
 
Lou de Laâge (vista no fenomenal A Espera [1]) e Agata Buzek revelam-se no ying-yang destes mundo em plena transformação ideológica, as suas posições de combate às tradições enraizadas no medo de outros tempos, esse receio pela Mão Divina de Deus que parte em castigos severos perante as obscenidades corporais, essa violação da “sagrada” virgindade, descrito nos seus livros sagrados. E quem não é mais adequada para personificar essa Ordem, esses Mandamentos prescritos, do que Agata Kulesza (Ida [2]), a desempenhar uma intolerante Madre Superiora? 
 
Em todo o tempo que nos compele, Agnus Dei – As Inocentes nunca faz jus às complexidades das temáticas político-sociais que extrai, e tendo como especial cuidado o território religioso. Trata-se daqueles filmes emoldurados com técnica e experiência, e sustentados por desempenhos sólidos por parte do seu elenco. Já agora, vale a pena salientar o papel mais sério do ator Vincent Macaigne [3], para mostrar que o homem serve muito mais do que preencher o estereótipo de “loser” quarentão, que muita comédia francesa recorre. Resumindo e concluindo, eis o melhor filme da carreira de Anne Fontaine.   
 
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Hugo Gomes