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Calabria: que a morte vos acompanhe

Como o cinema é fascinado por road trips! Como as mesmas transformam-se em jornadas pessoais ou coming-to-age para personagens inocentes! Em Calabria, por outro lado, essa viagem, mesmo tendo um objetivo seguro, é uma linha plana sem desenvolvimentos pessoais, as suas personagens são as mesmas, inerentemente falando, do início, no meio e no seu desfecho.

Tal como Louis L’Amour havia citado – “O caminho é o que importa, e não o seu fim” – Calabria adquire a sua dimensão enquanto produto documental no percurso, onde dois imigrantes suíços (um português e um sérvio), sem nada em comum, tirando o facto de serem ambos empregados de uma funerária, partem numa longa viagem para entregar o corpo de um imigrante italiano. A narrativa faz-se pelas paragens em áreas de serviço e hotéis, que funcionam como pausas de um ininterrupta confissão. Os dois protagonistas dialogam sobre os seus medos, os ideais, o amor e até mesmo a cultura. O morto que transportam é o testemunho mudo desta troca de palavras, recorridas a um tom de companheirismo, sem afetos gratificantes, nem evoluções aparentes na relação de ambos. São meros colegas, prontos para cumprir o seu trabalho, cujas conversas correspondidas são meras distrações, entretenimentos para as horas que seguem, porém, são nelas que concentra as suas respetivas expressões étnicas.

Um retrato etnográfico sem as odes do neorrealismo, sem a abrangência de uma determinada investigação? Pois bem, Calabria é um estudo sobre gente, um jogo ao acaso inserido nesta ideia onde a morte é a aproximação destas vidas, e cuja diversidade celebra-se perante festividades mórbidas.

O realizador Pierre-François Sauter humaniza a imigração, atribui-lhes uma face, um passado, sonhos e relações afetivas a um fenómeno cada vez mais desprezado, criticado e sobretudo anexado a agendas politicas. Calabria é um agradável exercício de temáticas indiretas, na qual a Morte é novamente servida como palco de fundo para um estudo sobre a Vida.