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«Demon» por Hugo Gomes

Desde o primeiro momento que o espectador pressente um iminente caos. Todo o redor é estranho, indiferente e demasiado abrupto, até que por fim dá-se a verdadeira assombração. A juntar a isso, um casamento organizado no tempo de um viagem entre Inglaterra e Polónia, a união de facto que gradualmente torna-se num festival caótico, onde os espíritos, já muito moribundos, não querem ficar de fora do matrimónio, porque essa é a sua única oportunidade de pedir auxilio. 
 
A sensação de assistir Demon, o filme de Marcin Wrona, é idêntica a uma espreitadela a The Shinning, de Stanley Kubrick, a loucura vai tomando posição ao longo da intriga e o bizarro acontece em segundo plano, um filme por detrás do nosso filme. Mas não é somente  um paralelismo encontrado com a famosa obra com Jack Nicholson que nos deparamos, na realidade, não há que negar, Demon vai beber a água da mesma fonte, ora se o twist final tem muito de “replicado”, é na banda sonora que encontramos o elo mais tingivel, Krzysztof Penderecki, o compositor que havia trabalhado com Kubrick em 1980 em tal partitura, faz aqui a sua colaboração. 
 
Coincidências? Não creio. Contudo, as referências não terminam aqui, na carreira de Penderecki existe outro filme que merece a menção neste olhar a Demon, O Exorcista. Em relação ao celebrizado filme de William Friedkin a questão não está no exorcismo, nem em possessões (no caso de Demon a variação é judaica), mas sim na manifestação demoníaca que a entidade possuída parece comportar na presença de multidões até chegarmos a um embate ideológico entre ciência medicinal e teologia. 
 
Wrona pactua essa enésima incorporação espiritual com um humor negro corrosivo e um surrealismo que vai ganhando dimensão, maneirismos quase dignos do cinema imparável e inventivo da Nova Vaga e dos seus predecessores. Depois temos Itay Tiran a conseguir uma duplicidade invejável para com o ritmo do filme. 
 
Hilariantemente diabólico este Demon, um filme que se constrói com o “esqueleto” de fantasmas passados, mas nunca esquecidos, invocados sob a forma gasosa neste requintado exercício de extremos.  
 
O melhor – Itay Tiran e o caótico cenário apresentado por Marcin Wrona
O pior – ficar muito a dever à sua inspiração.
 
 
Hugo Gomes