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American Honey: Procura-se Amor na América do Ódio

Andrea Arnold estreia em terras norte-americanas com esta “road-trip” sob toques coming-to-age centrado numa América profunda, os EUA white trash” onde residem os potenciais apoiantes das campanhas eleitorais de Donald Trump. Mas este “American Honey”, título inspirado numa música de Lady Antebellum, está acima de qualquer ideologia política. Aliás, de ativismo nada tem, apenas rebeldes sem causa, quase enxertados dos filmes de Nicholas Ray ou do tremendo “Badlands”, de Terrence Malick (uma provável inspiração), onde o percurso vale mais que o seu próprio destino, se no caso de existir algum…

Arnold tem uma “queda”, uma fascinação por criaturas raras, personagens que dificilmente captam a simpatia do público. Quando o conseguem, este é um efeito dignamente carnal. São estes jovens que acompanhamos impulsivamente numa direção algo intrusiva e “empestada” por uma coletânea musical que atribui o espírito indomável e hedonista ao grupo. No centro desta jornada a “nenhures”, Star (Sasha Lane), uma rapariga de 18 anos, decide certo dia, após o contacto com um grupo de jovens viajantes, largar a sua vida “aprisionada” numa família disfuncional e desfragmentada para embarcar no desconhecido. O desconhecido leva-a a várias cidades do interior dos EUA, tendo como objetivo desta mesma viagem em “família”, a venda de inscrições para revistas, uma tarefa inicialmente difícil para Star devido à sua perturbada natureza.

Depressa o grupo revela-se numa espécie de tribo, conduzido por regras e “tradições”, sendo que entre elas contam-se a imperativa reação a uma música da Rihanna, ou o combate, algo agressivo, dos dois membros mais fracos desse mesmo grupo, tudo em concordância com uma ordem, ou um desordem marginal como quiserem apelidar. O espectador fica a mercê desta “mini-sociedade”, “irmãos de sangue e de sémen” sem qualquer perspetiva sócio-política, até porque a grande veneração aqui é “gozar” os curtos anos de jovialidade, a “frescura” de um mundo ainda por descobrir e de sentimentos ainda por sentir. Serão estes os “meninos perdidos” de Peter Pan?

Se o grupo é isento de qualquer resistência, seja ela qual seja, já Andrea Arnold tenta a espaços colmatar as suas ideias, reduzindo-as a aspectos cénicos, técnicos e sensoriais. Os imensos point-of-view de insectos estabelecem um ponto de contato com uma sociedade indulgente e futilmente insignificante, e a relação destes com a protagonista provam a sua gradual procura intrínseca, no final a “coisa” evolui, entre as suas mãos já não existe invertebrados, mas sim uma tartaruga como símbolo de uma nova etapa na ainda “verde” vida.

No meio desta jornada, ainda deparamos com uma curiosa sequência que liga a Star com o seu lado mais afetivo e emocional, tudo ao som de Bruce Springsteen e o seu “Dream, Baby, Dream”, o provável único momento em que o espectador tem a certeza absoluta que a nossa protagonista é mais que uma somente adolescente vazia quase dilacerada de “Spring Breakers”, de Harmony Korine. Talvez seja algo mais, porém, a sociedade não auxilia qualquer desenvolvimento nas questões da sua identidade. Para finalizar, Shia LaBeouf está em grande, provando que Hollywood não é o único caminho para a eventual imortalização.