Quinta-feira, 28 Março

«Nessuno Si Salva da Solo» por Hugo Gomes

Depois da triste experiência que fora Voltar a Nascer (Venuto al Mondo), o realizador Sergio Castellitto em conjugação com a sua habitual argumentista, Margaret Donnelly, regressam aos enredos emocionalmente ambiciosos com Nessuno Si Salva da Solo (Ninguém se Salva Sozinho). Mas ao contrário do referido “desastre”, a dupla soube conter-se dos egocentrismos.

A reunião de um casal, separado há bem pouco tempo, a fim de discutir as férias de verão dos filhos, leva-nos ao encontro de uma reflexão quanto à manutenção e desenvolvimento das relações afetuosas, onde o amor e o ódio parecem deslocar-se lado-a-lado, cúmplices e manipuladores de vidas torturadas preenchidas por sonhos desfeitos. É o conto matrimonial, com todos aqueles toques novelescos equiparados a lugares-comuns nauseabundos do cinema, mas que Castellitto ousa inovar-se sob um certo ar de artimanha, escondendo o evitavelmente básico com a proclamação de filosofias “sinceras”. São aquelas juras de amor bacocas que não merecem a nossa credibilidade, mas que optamos por acreditar, “i love the way you lie“, quase soando como uma canção de “vira disco e toca o mesmo”.

A verdade é que mesmo apostando numa narrativa curiosa, a exposição de uma trama tão vulgarizada que é desmontada e montada sobre um senso de falso flashback, Nessuno Si Salva da Solo perde pela quebradiça pretensão de assumir-se profundo (há aqui uma preocupação em seguir território de Garrel ou de Blue Valentine), alternando esses tão badalados elementos de quotidianos afetuosos por poemas declarados à validade da vida. O seu último ato evidencia tal vertente, uma “inesperada” preocupação com a “imortalidade”, a busca pela “grande beleza” das relações amorosas.

Castellitto novamente colocou a “carroça à frente dos bois”, induzindo-nos um filme sob verdadeiras crises identitárias, mais do que matrimoniais. Os atores parecem, inclusive, contagiados com tal depressão. Jasmine Trinca, por exemplo, está em modo terminal. Pois, como o título refere, o filme não se salva sozinho.

O melhor – a proposta
O pior – o resultado


Hugo Gomes

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