Quarta-feira, 24 Abril

«Pride and Prejudice and Zombies» (Orgulho e Preconceito e Guerra) por Duarte Mata

 

Sem ironias, a fusão que se tem feito de clássicos da literatura com o universo fantástico é uma ideia criativa de despertar um interesse renovado no romance que lhe serviu de inspiração, sem, de maneira nenhuma, desrespeitá-lo (para os interessados, há também um Sense and Sensibility and Sea Monsters e um Android Karenina). Orgulho e Preconceito e Guerra (enormíssima e injustificável lacuna na tradução) é, no mínimo, um objeto curioso, conservando a dimensão das personagens de Jane Austen e a totalidade do espírito do seu mais famoso livro Orgulho e Preconceito.

O título diz tudo, é o clássico dos clássicos da escritora britânica, mas, desta vez, o exército encontra-se em guerra contra uma praga de mortos-vivos (Mr Darcy, o principal interesse amoroso, é o melhor guerreiro, obviamente) e, Elizabeth Bennet e as suas irmãs já não são apenas as donzelas indefesas a aguardar por matrimónios estáveis no meio de uma sociedade superficial (embora este último ponto se mantenha), mas amazonas treinadas em países orientais e que, no meio dos namoricos e preconceitos porque passam, ajudam a exterminar essa maldição. É a mesma história, só que em vez de tricotarem e lerem nos tempos livres, estas mulheres afiam facas e treinam jiu-jitsu, algo que, apostamos, a audiência feminista deverá aplaudir até ficar com as mãos em sangue.

Parecendo que não, há a dificílima tarefa dos atores em manter a seriedade das personagens, também um dos aspetos a não menosprezar na realização de Burr Steers, que poderia ter escolhido levar o filme para a palhaçada desde o começo (o nosso maior medo). A produção está construída como um autêntico filme de época e se tirarmos tudo o que seja relacionado com mortos-vivos tem-se, de facto, uma adaptação sóbria do romance original, não muito longe da de Joe Wright feita há uma década. Tal como uma boa paródia, a comédia vem das alterações ligeiras feitas à prosa (por exemplo, a célebre primeira frase “É uma verdade universalmente aceite que um homem solteiro na posse de uma fortuna avultada necessita de uma esposa” encontra-se aqui alterada para “É uma verdade universalmente aceite que um zombie que se alimenta de carne humana, necessita de se alimentar de mais carne humana“) e aposta no conhecimento do espectador, não o tomando por parvo e achando-o capaz de perceber as referências. Por isso, por mais que pareça alterado, a delicadeza, a eloquência, enfim, a essência da obra encontra-se imaculada, o que não é, definitivamente, tarefa para todos. Para além disso, cumpre o que se propõe a fazer enquanto obra cinematográfica. O que podemos resumir em duas palavras: entretenimento inteligente.

O melhor: A difícil tarefa em não desrespeitar o romance de Austen.
O pior: Apesar de tudo, peca por alguma previsibilidade e uns pontos que ficaram abertos (os cavaleiros do Apocalipse).


Duarte Mata

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