Sexta-feira, 19 Abril

«Mistress America» por Hugo Gomes

Escrito a meias com a sua protagonista, Greta Gerwig (que o também fora em Frances Ha), Mistress America remete-nos aos dramas universitários de uma jovem que procura o seu lugar na comunidade da sua Universidade.

Lola Kirke (cujo maior papel da sua carreira até à data foi em Gone Girl, de David Fincher) é essa jovem distintamente “baumbaquena“, sofrendo com uma leviana crise existencial e de superação pessoal, cuja motivação necessária é encontrada quando conhece a sua futura “meia-irmã”, Brooke (Gerwig), uma personagem singular, descrita como uma figura no limiar da “flor da idade” e de uma vida constantemente à deriva de ideias soltas e de ocasiões. Ela é a Mistress America, a mulher das oportunidades, a que nunca cede os seus idealismos que visam a sua posição anti-laboral e anti-educacional. Ambas as personagens irão formar uma cumplicidade em prol das suas respectivas emancipações, ao mesmo tempo que Brooke é desafiada pelo seu passado.

O nova-iorquino Noah Baumbach, agora mais ativo que nunca, concentra-se em mais uma história sobre marginais sociais que acabam por fim figurar-se no mesmo sistema que tanto rebelaram. Enquanto que Frances Ha transportou tal conotação num registo “coming-of-age” e suspenso por inspirações óbvias à nouvelle vague (de certa forma, Baumbach é integrante num movimento artístico perpetuado por Whit Stillman), em Mistress America o cineasta tem a “indecência” de comportar-se como sempre havia comportado, porém, cedendo por fim aos modelos cinematográficos e argumentativos que tenta em todo o caso fugir, mas que acaba por “abraçar”. Pois bem, parece que o habitual colaborador de Wes Anderson faz filmes sobre a sua própria essência, no sentido que a rebeldia que tanto demonstra é apenas fogo de artificio que vai sempre “desaguar na mesma foz”.

Poderíamos resumir Mistress America como um jovem que assume uma contracultura, porque simplesmente nela encontra uma forma de corresponder à moda de defesa de uma contraposição social, e não como uma crença vivente e quotidiana. Noah Baumbach trai as suas aspirações enquanto cineasta independente e, nesta sua nova obra, tais fragilidade acentuam para dar composição a uma comédia ligeira e de cariz cosmopolita que esboça o ridículo como uma gag prolongada.

Aqui, Greta Gerwig torna-se numa “rainha”, controlando a fita e o seu percurso narrativo, mas não chega a ser uma Frances Ha, aquela personagem indigesta que deliciosamente nos identificamos. Ao invés disso, no papel de difícil interpretação, temos uma Lola Kirke numa prestação que não convence de todo, sem qualquer tipo de personalidade imperante, liderando uma conjunto de secundários excêntricos e incompletamente tracejados. Será que Noah Baumbach perdeu realmente o toque? Talvez, mas pelo menos volta a mostrar que é dotado de requinte na sua selecção musical.

O melhor – Greta Gerwig, apesar de tudo.
O pior – De certa forma é uma obra pseudo-hipster: tenta ser diferente mas acaba por dissipar-se na fórmula. 


Hugo Gomes

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