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«The Martian» (Perdido em Marte) por Roni Nunes

Decorre em tribunal um processo movido por um argumentista russo que alega lhe terem sido roubadas ideias para a construção deste Perdido em Marte. Caberá ao compatriota de Vladimir Putin provar onde elas estão, pois tudo neste filme já parece ter sido exibido em algum lado.

A começar pelo ponto de partida, utilizado há dois anos em Gravidade: um astronauta, Mark Watney (Matt Damon), é atingido por destroços e fica sozinho no espaço a lutar pela sobrevivência. Sem a pretensão de maiores voos, no entanto, o veterano Ridley Scott apoia-se no argumento terra-a-terra de Drew Goddard para transpor para Marte a fantasia de Robinson Crusoé – com realizador e argumentista esmerando-se em dar dinamismo e criar situações inventivas para uma epopeia de um homem só que evita cair na amargura progressiva da criação de Daniel Defoe.

As sequências marcianas, a sustentarem-se na empatia de Matt Damon e num humor leve, enquadram-se dentro do conceito de entretenimento, falhando apenas quando a aparência de realismo que a ficção científica deve buscar não consegue atingir a suspensão da descrença pelos exageros (independente do marketing habitual de que um consultor da NASA, aliás mais publicitada do que nunca, trabalhou de conselheiro).

Dito isto, o filme sobreviveria como um primo pobre da estupenda poesia metafísica de Alfonso Cuarón ou do emocionante e engenhoso puzzle de Christopher Nolan (trabalhos minuciosos de verdadeiros artistas) se nunca tivesse saído de Marte. Quando isso acontece, Goddard e Scott vão buscar o mais espantoso leque de personagens de cartão e situações de sentimentalismo cliché (só de exaltações coletivas são três!) de que se tem notícia – apoiados num cast estelar de caricaturas.

De resto o argumento ainda cola com cuspo o habitual cameo dos chineses em blockbusters (questões de mercado), que só aparecem, no entanto, depois de uma chuva de estrelinhas brancas sobre fundo azul (da bandeira yankee, não do céu) ter aparecido vezes suficiente para a republicaníssima Fox espantar o fantasma de um planeta vermelho. Tudo “very funny, very entertaining, of course”.

O MELHOR: a parte marciana enquadra-se bem no conceito de entretenimento leve.
O PIOR: este mesmo conceito implicar em clichés e propaganda nada subliminar. 


Roni Nunes