Quinta-feira, 28 Março

«What We Did on Our Holiday» (O Nosso Último Verão na Escócia) por José Raposo

O Nosso Último Verão na Escócia, uma comédia dramática realizada pela dupla Andy Hamilton e Guy Jenkin, conta-nos a história de uma reunião familiar cheia de problemas. Doug (David Tennant) e Abi (Rosamund Pike), um jovem casal em pleno processo de separação, resolvem levar os filhos numa viagem até à Escócia para festejar o aniversário de Gordie (Billy Connolly), o pai de Doug. Hamilton e Guy são os mesmos responsáveis da série britânica Outnumbered e, ainda que não se possa falar aqui com rigor de uma transposição direta da televisão para o cinema, as semelhanças temáticas e dramáticas entre as duas produções são evidentes. As peripécias do quotidiano de uma família londrina são território comum e a tentativa de extrair humor de situações mais ou menos rocambolescas acaba por ser, também sem surpresa, o principal veículo para a comédia.

Como pano de fundo, no meio de gags e peripécias francamente pouco inspiradas, encontramos uma narrativa que procura estar do lado das boas intenções. O pai de Doug tem um problema de saúde terminal e a proximidade com a morte – tão difícil quanto inevitável – acaba por constituir uma lição sobre as tragédias da vida adulta. Por outro lado, e talvez seja este um dos pontos mais interessantes, o divórcio eminente dos pais não parece impedir ou sequer dissolver a função nuclear da família enquanto estrutura basilar da vida em sociedade. Em ambos os casos, cabe aos filhos do casal a (re)afirmação de um conjunto de valores entretanto perdidos ou desvalorizados no mundo dos adultos.

Estamos bastante distantes, claro, de um filme que procure refletir sobre estes temas com algum distanciamento. Mas é justamente por não ser esse um dos propósitos do filme que, mesmo ao enunciar de forma assumidamente superficial as malhas com que se cosem as tessituras ideológicas da ficção mais inocente, vamos mais facilmente ao encontro dos automatismos da ficção e do drama mais preguiçoso, que teimam em “tingir” o real.

Apesar de tudo, é a enorme dificuldade em trabalhar as tonalidades dramáticas da comédia que acaba por provocar a maior desilusão. Uma comédia sem graça é uma das experiências de cinema mais dadas à frustração e, ainda que o material que dá origem à narrativa não seja exatamente um diamante em bruto, fica-se com a sensação que as piadas se perdem no meio de uma encenação inexplicavelmente confusa e all over the place. Lá mais para o final há um gag que envolve uma achega ao mundo dos tabloides e dos escândalos mediáticos e esse acaba por ser um dos exemplos mais expressivos de uma incoerência que atravessa todo o filme. Na sucessão dos diversos gags que vão compondo a ação é também possível que o espectador dê por si a pensar na figura de Rosamund Pike (e até na do próprio David Tennant, que embora longe de ser um ator regular tem aqui uma interpretação para esquecer): como pode a mesma atriz de Em Parte Incerta desempenhar aqui um papel tão pobre? Na melhor das hipóteses reforça-se a tese hitchcockiana que diz que serem os realizadores os supremos responsáveis pela interpretação dos atores, ainda que o mestre a tenha enunciado de forma muito mais convincente e memorável.

O melhor: O desempenho naturalista dos jovens atores.
O pior: A sensibilidade para os contornos de um exagero manifestamente absurdo, que tem inúmeros e exemplares antecedentes na comédia britânica. 


José Raposo

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