Quinta-feira, 25 Abril

«Lost River» (Rio Perdido) por André Gonçalves

Primeiro as boas notícias: Lost River, o primeiro filme do excelente ator Ryan Gosling (Half Nelson, Lars e o Verdadeiro Amor, et al), tem algumas das imagens mais marcantes do ano. As más notícias é que estas imagens são “roubadas” aqui e ali, além de serem pedaços soltos ao serviço de uma narrativa difícil de pescar, e daí compreender-se os apupos que o filme foi alvo em Cannes no ano passado.

Foi ao ter visitado uma Detroit em estado de miséria nas gravações de Nos Idos de Março que Gosling terá germinado a ideia de filmar aquela realidade passada para uma cidade fictícia e surrealista/onírica. Esta “história” de uma família em dificuldades é afinal de contas em tudo semelhante às notícias reais que nos surgem. E se começamos com uma construção até algo poética, depressa os eventos tornam-se mais macabros e passa a valer tudo – incluindo tirar peles…

Billy, a mãe solteira endividada em risco de perder a casa onde criou os seus filhos (Christina Hendricks a repetir um pouco o seu papel em “Lugares Escuros”), vê-se obrigada a aceitar um trabalho do gerente do banco num clube onde os adultos vêem os seus fetiches mais obscuros concretizados. Um sítio onde Gosling aproveita para espelhar tudo o que aprendeu a ver filmes de David Lynch, escalando-os a um grau de insanidade semelhante ou até superior.

O grande problema de Lost River é, para além da história mal amanhada, um problema de referências soltas típico de estudante a querer elaborar a maior carta de amor aos seus ídolos, um “copy-paste” que não é só restrito a Lynch, mas também a nomes como Nicolas Winding Refn (Drive) ou os próprios Stanley Kubrick (também o que se passa naquele clube) e Terrence Malick (com o prólogo). No meio de tanta referência, e de sequências que testam a sanidade do espectador – irritando e estimulando em igual grau, não temos propriamente aqui uma voz própria, que nos faça sentir que Gosling, para além de se revelar alguém sem quaisquer pudores em mostrar os seus lugares escuros, seja um novo autor a seguir. A escolher um título mais honesto para esta película, escolheria “Realizador Perdido”.

É pena, porque haveria espaço nesta história para atar as pontas e construir alguma substância que pudesse pelo menos sustentar tanto estilo alheio…

O melhor – a imagética.

O pior – a ausência de uma voz própria.


André Gonçalves

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